Querido leitor (a), você ficou, eu fiquei, todos ficamos abalados com a notícia do encerramento das atividades da Ford no Brasil, anunciada como uma espécie de presente de ano novo para o governo do, Deus que me perdoe, Jair Bolsonaro. Então, convido você a acompanhar os dados abaixo compilados, para observar que há seis anos estamos descendo a ladeira em desabalada carreira:
1) Entre 2015 e 2020, foram extintas 36,6 mil fábricas, o que equivale ao encerramento das atividades de 17 estabelecimentos industriais por dia. Segundo a série histórica, iniciada em 2002, até 2014 o número de fábricas crescia…
2) O número de famílias em extrema pobreza cadastradas nos programas sociais do governo federal superou, no ano passado, a casa de 14 milhões – o que equivale a 39,9 milhões de pessoas –, alcançando o maior contingente desde 2014, quando o Brasil comemorou a saída do Mapa Mundial da Fome.
3) A taxa de desemprego chegou a 14,3% no ano passado, atingindo 14,1 milhões de pessoas. O número de empregados sem carteira assinada chegou a 9,5 milhões, os autônomos 22,5 milhões, e os informais, 32,7 milhões. Em 2014, o Brasil registrou a menor taxa de desemprego já registrada, 4,8% do total dos trabalhadores economicamente ativos, o que significa que, pela primeira vez em nossa história, tivemos o que se denomina pleno emprego.
Esses são números frios, sensível leitor (a), e referem-se apenas a um aspecto da economia. Por trás de cada número há um rosto, uma história, um sonho…
Ah, só para lembrar – que aqui neste país tropical, abençoado por Deus e bonito por natureza, temos a memória comprometida por tanto sal, e céu, e sol – 2014 marca a eleição de Dilma Rousseff para cumprir seu segundo mandato, aquela eleição que os tucanos, liderados pelo probo ex-senador Aécio Neves, secundados pelos patriotas de camisa verde-amarela e fundamentalistas cristãos, e patrocinados pela grande mídia, nunca engoliram. Os dois anos de mandato de Dilma, interrompidos pelo bizarro golpe parlamentar – aquele crime que ela cometeu, como era mesmo?, os eméritos juristas Miguel Reale Junior e Janaína Paschoal devem recordar, aquele troço, ah, vocês sabem, né? –, foram completados por outro grande jurista, Michel Temer, lembra dele?, sucedido pelo, Deus que me livre e guarde, Inominável. Este, por sua vez, chegou onde está, nunca é demais chamar a atenção, com o voto de 58 milhões de eleitores e a conivência de outros 42 milhões (que votaram em branco, anularam ou nem se deram ao trabalho de se dirigir às urnas).
Como escreveu o grande vate português, Luís de Camões, em sua epopeia, Os lusíadas, “um fraco Rei faz fraca a forte gente” – está no Canto III, estrofe 138, confere lá.
Luz na escuridão
José Santos, poeta, autor de literatura infantil e juvenil: “Estou envolvido em um projeto muito interessante. Se chama Mapa da Poesia, feito com a designer e ilustradora Iêda Alcântara. Ideia antiga, essa coleção de livros (impressos e digitais), voltada para crianças e jovens, já tem dois livros com temática portuguesa no prelo (ainda se fala assim?) e mais uma lista de candidatos a serem mapeados, entre Minas Gerais e África. A Iêda cuida do projeto gráfico, capa e ilustrações. Eu faço os poemas, as notas e glossário, como foi o caso do volume 1, Portugal, que será lançado neste semestre. No volume 2, Lisboa, divido os poemas com o escritor português, Alexandre de Sousa. A mineira Iêda vive em Lisboa há seis anos e conseguiu traduzir muito bem essas variadas paisagens. O terceiro livro irá mostrar uma cidade de Minas, da Zona da Mata, chamada Juiz de Fora”.
Parachoque de caminhão
“O ridículo é uma espécie de lastro da alma quando ela entra no mar da vida; algumas fazem toda a navegação sem outra espécie de carregamento.”
Machado de Assis (1839-1908)
Antologia pessoal a poesia brasileira
Alvarenga Peixoto
(Rio de Janeiro, RJ, 1742 – Ambaca, Angola, 1792)
Soneto
Eu não lastimo o próximo perigo,
Uma escura prisão estreita, e forte,
Lastimo os caros filhos, a consorte,
A perda insuperável dum amigo.
A prisão não lastimo, outra vez digo
Nem o ver iminente o duro corte;
É ventura também achar a morte,
Quando a vida só serve de castigo.
Ah! quão depressa então eu não sentira
Este enredo, este sonho, esta quimera,
Que passa por verdade, e que é mentira.
Se filhos, e Consorte não tivera,
Se do amigo as virtudes possuíra
Só de vida um momento não quisera.