Conversa com Itamar Vieira Junior
1.
Carola: Começo com uma citação de Deleuze, que tem sido um tema em nossas conversas de Instagram: “As pessoas pensam sempre em um futuro majoritário (quando eu for grande, quando eu tiver poder…). Quando o problema é o de um devir-minoritário: não o fingir, não fazer como ou imitar a criança, o louco, a mulher, o animal, o gago ou o estrangeiro, mas tornar-se tudo isso para inventar novas forças e novas armas”. Como “tornar-se tudo isso”? Será algo que se pode aprender ou é mais um ato, um acontecimento à revelia do sujeito?
Itamar: Bom falar em Deleuze. Sabe, Carola, o pensamento sobre o devir, desde Heráclito a Tim Ingold, tem me acompanhado há muito tempo. E Deleuze, sem dĂşvida, foi o que mais contribuiu para a minha compreensĂŁo de que, mais que seres, somos devires humanos. VocĂŞ recorda a tese sobre o rio de Heráclito? NinguĂ©m se banha no mesmo rio duas vezes? Pois nĂłs nĂŁo somos os mesmos. Estamos em permanente transformação, o que me soa maravilhoso, radical e inconciliável com as ideias estáticas do pensamento ocidental. É incrĂvel como o pensamento de Deleuze se aproxima da cosmovisĂŁo dos povos originários, dessa compreensĂŁo da vida como um fluxo. E vocĂŞ me pergunta como “tornar-se tudo isso”? Carregamos esse princĂpio transformador, essa capacidade de apreensĂŁo Ăşnica que chamamos de educação. A educação Ă© um ato, que independe de sistemas de conhecimentos sistematizados. Vem do latim educere, que significa “ir para fora”. Diz mais respeito Ă nossa capacidade de aprendizagem, uma capacidade tambĂ©m observada em outras espĂ©cies. É a capacidade de aprender, mas tambĂ©m a de se abrir ao mundo, ao outro, de exercitar a alteridade.
Carola: Sabe que por sugestĂŁo sua eu li o Tim Ingold, li Estar vivo e fiquei fascinada, e tem tanto a ver com tudo o que venho pensando nos Ăşltimos tempos, esse deslocamento de nĂłs mesmos, essa interconexĂŁo de fluxos constantes. Aliás, me parece que há muitos pontos em comum entre o Ingold e a Donna Haraway. Sim, Deleuze Ă©, entre tantos filĂłsofos, aquele que mais se aproxima do pensamento dos povos originários, talvez por ele questionar de forma tĂŁo veemente a nossa noção de sujeito, um questionamento que vai contra a ideia estática de um nĂşcleo, um “eu” que nos define. Uma das coisas que mais gosto em Deleuze Ă© a forma como ele relativiza a prĂłpria noção de inconsciente, e se afasta da ideia de uma histĂłria Ăşnica (a histĂłria edĂpica freudiana). Há ali uma rota de fuga, uma possibilidade outra para a construção de quem somos, nĂŁo mais um “eu” estático, mas um eu-fluxo (o rio de Heráclito, como vocĂŞ bem lembrou). Sobre a educação, tenho pensado muito na educação como um movimento de nos permitir saber aquilo que sabemos (um saber do corpo, da intuição, do inconsciente, do inconsciente coletivo). Convivendo com minha filha, percebo o quanto há na infância um saber intuitivo profundo, filosĂłfico atĂ©, mas tambĂ©m ancestral que está nela e que muitas vezes a nossa arrogância impede de vir Ă tona. E fazemos isso nĂŁo sĂł com as crianças…
2.
Carola: VocĂŞ ministra um curso chamado “Literatura e experiĂŞncia antropolĂłgica”. E eu me lembrei de uma frase do Deleuze: “NĂŁo existe literatura que nĂŁo faça apelo a um povo que ainda nĂŁo existe”. Venho pensando muito nessas questões tanto relacionadas ao futuro quanto ao passado, a literatura como uma experiĂŞncia, um fazer coletivo, de todo um povo e nĂŁo somente de um indivĂduo, como nossa sociedade costuma pensar. Uma literatura que se distancia do sujeito construĂdo pelo sistema capitalista e se aproxima de formas de arte muito comum em grupos situados Ă margem do sistema, do mercado.
Itamar: A literatura Ă© uma das muitas expressões da experiĂŞncia humana, eu diria. E por se debruçar sobre essa experiĂŞncia, ela Ă© inesgotável, deve ser plural e importante como fonte de conhecimento sobre o outro. NĂŁo um conhecimento sistemático, informativo, mas um conhecimento em linhas mais subjetivas, no campo dos sentimentos, aquilo que nos une em nossa humanidade. Acho que a capacidade de elaborar ficção nos diferencia de outras espĂ©cies e nos acompanha desde a chamada revolução cognitiva, que ocorreu entre 70 mil e 40 mil anos atrás. Olho para inscrições rupestres e vejo literatura — ou o que sĂŁo as novelas gráficas? Recordo das histĂłrias de famĂlia e penso nas pessoas que narravam essas histĂłrias tendo que fazer escolhas sobre como começar e terminar para apreender a atenção de quem escutava. A antropologia Ă© uma fonte de conhecimento sobre o outro. Compreendendo o outro somos capazes de alcançar algum nĂvel de entendimento sobre nĂłs mesmos. Se o universo literário Ă© um fazer coletivo, escrever quase sempre Ă© o testemunho pessoal diante desse coletivo.
Carola: Fico pensando se a capacidade de elaborar ficção nĂŁo Ă© algo que surge com a prĂłpria linguagem, pois se eu conto qualquer coisa, por exemplo, fui caçar um javali e voltei, conto como foi, por mais que eu me atenha Ă realidade, Ă© sempre uma espĂ©cie de ficção. Pensemos na memĂłria, o que Ă© a memĂłria alĂ©m de uma forma de ficção? Suspeito que escolhemos uma das muitas ficções possĂveis e lhe demos o nome de realidade e depois fincamos ali uma bandeirinha, como quem chega na lua.
Itamar: Sim, de fato. Por exemplo, vamos nos ater aos dilemas da memĂłria: a memĂłria Ă© sempre uma relação dialĂłgica entre o que escolhemos lembrar e esquecer, mesmo que de maneira inconsciente. E para que esses fios de memĂłria, que julgamos ser “reais” e guardamos com lembranças, façam sentido, preenchemos seus interstĂcios com ficção. Claro que nĂŁo com uma ficção fantástica — embora possa ocorrer tambĂ©m —, mas com uma ficção que tenta recriar um mundo de sentido para nossas prĂłprias recordações. E ao repeti-las muitas vezes, elas ganham o sentido da verdade.
3.
Carola: Quando li Torto arado fiquei muito impressionada, e a principal sensação que tive foi o sentimento de que ali havia algo que precisava urgentemente ser dito, ser contado, e que o livro, ao fazê-lo provocava uma espécie de explosão. E como na época eu estava lendo muito a Donna Haraway, não pude deixar de fazer conexões entre as irmãs do seu livro e as relações de simbiose e cooperação propostas por Haraway (em oposição à “lei do mais forte” do capitalismo). Deixo aqui um trecho de cada leitura:
Torto arado: Quando retomamos as brincadeiras, havĂamos esquecido as disputas, agora uma teria que falar pela outra. Uma seria a voz da outra. Deveria se aprimorar a sensibilidade que cercaria aquela convivĂŞncia a partir de entĂŁo. Ter a capacidade de ler com mais atenção os olhos e os gestos da irmĂŁ. SerĂamos as iguais. A que emprestaria a voz teria que percorrer com a visĂŁo os sinais do corpo da que emudeceu. A que emudeceu teria que ter a capacidade de transmitir com gestos largos e tambĂ©m vibrações mĂnimas as expressões que gostaria de comunicar. Para que essa simbiose ocorresse e produzisse um efeito duradouro, as disputas ficaram, naturalmente e por um tempo, de lado. Ocupávamos o tempo com as apreensões do corpo da outra.
Seguir con el problema: Generar parentesco en el Chthuluceno: Vivir-con y morir-con de manera recĂproca y vigorosa en el Chthuluceno puede ser una respuesta feroz a los dictados del Antropos y del Capital.
Itamar: Parece que a nossa sobrevivĂŞncia tem dependido desse laço vital de reciprocidade positiva. Uso aqui o adjetivo positivo para estabelecer uma diferença do significado mais amplo da palavra reciprocidade. Sua leitura me fez pensar na escolha da epĂgrafe do livro, um excerto de Lavoura arcaica. A intenção era introduzir o leitor no universo da histĂłria, embora as histĂłrias guardem grandes diferenças entre si. Enquanto uma descreve a ruĂna de uma famĂlia, a outra mostra a sobrevivĂŞncia a partir dos laços de solidariedade e parentesco que vĂŁo estabelecendo atravĂ©s do tempo. Esse sentimento de famĂlia Ă© virtualmente estendido aos membros do grupo de trabalhadores que vivem a mesma tragĂ©dia social. Por sua vez se torna a histĂłria de um povo, onde o passado ganha a marca indelĂ©vel de escultor do nosso presente histĂłrico. Se a Globalização e o Capitalismo tĂŞm nos impostos fragmentações de modos de vida, devastação e morte atravĂ©s da sua cultura de acĂşmulo de riquezas e de profundas desigualdades, a cooperação que surge desse confronto perene tem possibilitado o ideal de um outro mundo, de uma outra humanidade.
Carola: Sim, e talvez essa leitura que fazemos da natureza, o homem enquanto lobo do homem, a lei do mais forte, na verdade nada mais seja do que uma leitura capitalista da natureza. Gosto muito de uma autora, a biĂłloga Lynn Margulis, ela foi uma mulher brilhante que teve a coragem de enfrentar o status quo cientĂfico e questionar essa ideia, sua teoria era de que na natureza predominam relações de cooperação e nĂŁo de competição entre as espĂ©cies, como costumamos imaginar. Ela dá para isso, entre outras, a imagem de uma árvore, aquilo que enxergamos como um “indivĂduo” Ă© na realidade um grande organismo formado por inĂşmeros organismos e microorganismos que cooperam entre si.
“A literatura salva, mesmo que esse não seja o seu sentido. Me salvou e continua a me salvar da prisão que pode ser uma vida. Parece que para viver a vida de forma mais plena é preciso tocar muitas vidas, conhecer para expandir nossa própria experiência.”
4.
Carola: A literatura salva? Eu sempre me faço essa pergunta, e sempre encontro respostas diferentes.
Itamar: A literatura salva, mesmo que esse nĂŁo seja o seu sentido. Me salvou e continua a me salvar da prisĂŁo que pode ser uma vida. Parece que para viver a vida de forma mais plena Ă© preciso tocar muitas vidas, conhecer para expandir nossa prĂłpria experiĂŞncia. Nesse sentido a literatura me salvou inĂşmeras vezes. NĂŁo que a literatura tenha um objetivo. NĂŁo tem objetivo sistemático algum, nĂłs que atribuĂmos significados ao seu escopo. E para vocĂŞ? A literatura salva? Ela tem um propĂłsito definido?
Carola: Gosto muito dessa ideia: a literatura salva da prisão que pode ser uma vida. Respondendo à sua pergunta, sim, ela pode salvar. A literatura me salvou duas vezes. Na primeira, como leitora. Me salvou quando criança, eu fui uma criança muito melancólica, hoje diria que eu era uma criança deprimida. A literatura me mostrou outras possibilidades de mundo, outras formas de existir, mais guiadas pela imaginação, pela fantasia. Depois, já adulta, me salvou uma segunda vez, desta vez como escritora. A escrita me deu um lugar para onde voltar, um lugar que eu não tinha, e que eu vou construindo livro a livro. No meu caso, se não fosse a literatura, eu não estaria aqui. Quanto ao propósito, não, não acho que haja um propósito ou um sentido concreto, pra mim a literatura é uma espécie de caixa de ferramentas, dentro dela lentes que nos ajudam a enxergar o mundo, o que vamos fazer com elas, depende de cada um.
5.
Carola: Ao contrário da sociedade ocidental, para as culturas amerĂndias (e nĂŁo sĂł elas), o tempo Ă© circular. Penso na literatura como uma ferramenta capaz de apontar simultaneamente para o passado e o futuro, uma literatura capaz de reescrever o presente. SerĂŁo futuro e passado fios de uma trama que se tece simultaneamente?
Itamar: Gosto da imagem do futuro e do passado sendo tecidos simultaneamente. Os Evenkis, indĂgenas das tundras siberianas, compreendem a sua vida como uma linha. Quando questionados sobre sua origem, eles nĂŁo conseguem nos dar uma resposta que corresponda Ă nossa lĂłgica de lugar delimitado. Isso porque sua vida nĂŁo ocorre em um lugar, mas em todos os lugares. “Todos os lugares” Ă© a malha de trilhas interligadas ao longo das quais as pessoas vivem suas vidas. Somam-se Ă s suas trilhas as trilhas dos que os antecederam e assim por diante. Quando imagino as trilhas de nossos antepassados, costumo pensar o mesmo: sĂŁo suas trajetĂłrias histĂłricas que, por sua vez, sĂŁo capazes de se inscrever nĂŁo apenas no mundo social, mas tambĂ©m em traços que carregamos no nosso cĂłdigo genĂ©tico. NĂŁo por acaso a molĂ©cula de DNA Ă© formada por dois filamentos entrelaçados entre si como uma hĂ©lice. Nele encontraremos as marcas do nosso passado e algumas pistas do que podemos ser no futuro, que doenças ou problemas podemos desenvolver. É provável que daqui a algum tempo seja possĂvel mapear as potencialidades que cada ser humano abriga. O exemplo do DNA Ă© alegĂłrico para imaginar futuro e passado como fios de uma trama tecida simultaneamente. E se ela Ă© linear, nĂŁo impede que esses pontos de linhas se encontrem formando um cĂrculo.
Carola: É interessante pensar que o DNA funciona como uma linguagem, com sua sintaxe prĂłpria, Ă s vezes trocamos uma letra e pronto, muda completamente o significado. Me lembrei agora da ideia de “no inĂcio era o verbo”, ou seja, a palavra. Quem sabe “no inĂcio era o verso”… De qualquer forma, Ă© lindo isso, a ideia de um mundo criado atravĂ©s da palavra, um cĂłdigo genĂ©tico que está em tudo, uma escrita do mundo.
6.
Carola: Suely Rolnik, em seu livro Esferas da insurreição: notas para uma vida não cafetinada, nos dá dez sugestões para descolonizar o inconsciente. Uma delas é “Não negociar o inegociável”. Eu gosto muito. Penso muito nessa frase. E sinto que “não negociar o inegociável” vale para a literatura também.
Itamar: “NĂŁo negociar o inegociável” me lembrou algumas perguntas que me fizeram ao longo do Ăşltimo ano sobre o desenlace de Torto arado: se havia alguma relação com a histĂłria de Bacurau, de Kleber Mendonça. Logo apĂłs o lançamento, eu entrei numa espiral de eventos e nĂŁo consegui assistir de imediato ao filme. Meses depois, quando consegui ver, constatei de fato o significado desse questionamento. Por coincidĂŞncia, li Sobre os ossos dos mortos, da Olga Tokarczuk, e assisti Parasita, do diretor Bong Joon-ho, num intervalo de tempo pequeno. SĂŁo obras criadas no espaço de uma dĂ©cada, e que carregam o espĂrito dessa sentença da Suely Rolnik. NĂŁo haverá conciliação, nĂŁo negociaremos o inegociável, se as coisas permanecerem como estĂŁo. A literatura reflete a experiĂŞncia de quem a escreve. Talvez essa constatação seja o espĂrito do nosso tempo: nĂŁo há conciliação possĂvel para tamanho desequilĂbrio e desigualdade.
Carola: É curioso, pensando na minha vida, quando jovem, muitas vezes “negociei o inegociável”, algo que hoje eu jamais faria. Sinto que Ă medida que envelheço, vou me tornando mais radical, nĂŁo deveria ser ao contrário? (risos)Â
Itamar: Acho que para muitas questões tentaremos encontrar o caminho do meio, do equilĂbrio, da compreensĂŁo. Mas há outras que se tornam cada vez mais inegociáveis, inconciliáveis com o humanismo que vamos expandindo ao longo de nossas vidas. Talvez essa nĂŁo conciliação pareça radical, mas no fundo sĂŁo determinações que aprendemos a desenvolver. Quero acreditar, Carola, que se trata de um instinto de sobrevivĂŞncia, nĂŁo?
7.
Carola: Tenho lido muita poesia, cada vez mais. Como se a leitura do mundo sĂł me fosse possĂvel atravĂ©s do poema, uma sensação que começou com os acontecimentos polĂticos dos Ăşltimos anos no Brasil e se intensificou com a pandemia. NĂŁo tenho explicação lĂłgica para isso. E lembrei agora de um poema de Edimilson de Almeida Pereira, que de alguma forma tem a ver com toda esta conversa:
Santo AntĂ´nio dos Crioulos
Há palavras reais.
InĂştil escrever sem elas.
A poesia entre cĂŁs e bichos
é também palavra.
Mas o texto captura Ă© o rastro
de carros indo, sem os bois.
A poesia comparece
para nomear o mundo.Â
Itamar: Edimilson Ă© um dos meus poetas preferidos. Eu tambĂ©m tenho esse afeto pela poesia, sempre há livro de poesia na minha cabeceira. Por vezes empreendo estudos mais profundos, sem qualquer objetivo ou mĂ©todo sobre a poesia. É como contemplar uma árvore, sem pensar no conhecimento sistematizado que temos sobre ela. Um contemplar sentindo. Ela me ajuda a pensar minhas questões de forma mais subjetiva e menos simplista. O poema pode ser um grande tratado sobre o dĂptico consciente e inconsciente, talvez por isso essa atenção Ă poesia. Sua escolha me fez recordar uma entrevista de Anne Carson que foi parar num poema da Ana Martins Marques, “se a prosa Ă© uma casa, a poesia Ă© um homem em chamas correndo rapidamente atravĂ©s dela”. Tenho dito que escrever Ă© voltar para casa. Talvez por minha experiĂŞncia profissional e etnográfica aprendi a anotar, coletar informações e pensamentos, para depois escrever sobre eles. Escrever Ă© um ato solitário. É preciso, literalmente, voltar para casa para dar sentido Ă s percepções desordenadas que acumulamos. Já me perguntaram se viveria fora do Brasil. Confesso que neste atual estado de violĂŞncia generalizada do governo contra tudo e todos Ă© uma ideia que vez ou outra passa por minha cabeça. Se o fizesse seria por um instinto de sobrevivĂŞncia, nĂŁo por escolha deliberada. Acho que nĂŁo conseguiria mais escrever porque sempre estaria no exĂlio Ă espera de “voltar para casa”. Penso em vocĂŞ, Carola, que vive em permanente deslocamento. Como voltar para casa e escrever? Como sua experiĂŞncia literária Ă© construĂda a partir desse permanente deslocamento?
Carola: Que linda a sua pergunta, me emocionou, talvez por tocar nisso que é um dos meus temas principais, o deslocamento. Você diz que escrever é voltar pra casa, mas no meu caso, não há “casa” para voltar. Não há origem, não há nada. No fundo minha escrita é a minha casa, uma casa feita de palavras, palavras que vieram antes de mim, palavras que virão depois. Como diz o poema “a poesia comparece/para nomear o mundo”.
Itamar: Que lindo, Carola. Acho que sua resposta fecha bem nosso diálogo.