šŸ”“ LuĆ­s Cardoso

Ensaio fotogrƔfico de Luƭs Cardoso
Foto: Ozias Filho
01/09/2021

Uma oração. Uma ladainha. Um ritmo interno que move os ponteiros do relógio, num ciclo repetitivo, minimalista, e que a cada volta da sua rotação acrescenta um novo elemento à história, e que mesmo assim tem sempre o sentido de uma oração dita como um mantra, como que a expiar episódios, possibilidades, falhanços, recordações, antepassados, animais, países, homens, e a própria História. Uma História específica: a da construção de Timor-Leste.

Ɖ assim que degusto o Ćŗltimo livro de LuĆ­s Cardoso, O plantador de abóboras. Ɖ assim que sinto a sua litania, a construção da linguagem de um mundo efabulado num quase realismo mĆ”gico, que encerra todas as verdades que nos cercam.

Como leitor, sinto a cadĆŖncia de imagens e situaƧƵes como algo repetitivo, como se a própria história Ć  nossa volta fosse uma cantilena de repetiƧƵes e de erros, mas que no fundo insistimos no desejo esperanƧoso de alterarmos, de quebrarmos esta lógica perversa que resume o ser humano. Ɖ claro que o que nos conta LuĆ­s Cardoso, com o seu rosĆ”rio, com o seu evangelho, Ć© sobre um paĆ­s, libertado, e cuja libertação ainda traz marcas recentes e que estĆ£o em carne viva, e, por isso, sentimos na sua narrativa as vĆ”rias faces de um povo que busca apaziguar os seus tormentos e vislumbrar um futuro consistente.

Parafraseando um dos pensamentos elucidados por Eduardo Galeano, citando Fernando Birri, questionado para que serve a utopia, ele diz: ā€œserve para que eu nĆ£o deixe de caminharā€. Desta maneira leio O plantador de abóboras, como uma reza, uma repetição que, de tanto ser repetida, espanta os espĆ­ritos que nos tiram o sono (pois eles existem), e anseia um futuro radioso.

Foto: Ozias Filho

Foto: Ozias Filho

Foto: Ozias Filho

Foto: Ozias Filho

Foto: Ozias Filho
Foto: Ozias Filho

Foto: Ozias Filho

Foto: Ozias Filho

Foto: Ozias Filho
LuĆ­s Cardoso
Nasceu em Kailako, uma vila no interior de Timor-Leste. Conhece e fala diversos idiomas timorenses. Estudou nos colĆ©gios missionĆ”rios de Soibada e de Fuiloro e, posteriormente, no seminĆ”rio dos jesuĆ­tas em Dare e no Liceu Dr. Francisco Machado em DĆ­li. Licenciou-se em Silvicultura no Instituto Superior de Agronomia de Lisboa. Desempenhou as funƧƵes de Representante do Conselho Nacional da ResistĆŖncia Maubere em Portugal. Ɖ autor dos romances: Crónica de uma travessia, Olhos de coruja olhos de gato bravo, A Ćŗltima morte do coronel Santiago, Requiem para o navegador solitĆ”rio, O ano em que Pigafetta completou a circum-navegação e O plantador de abóboras.
Ozias Filho

Nasceu no Rio de Janeiro (RJ), em 1962. Ɖ poeta, fotógrafo, jornalista e editor. Autor deĀ Poemas do dilĆŗvio,Ā PĆ”ginas despidas,Ā O relógio avariado de Deus,Ā Insulares,Ā Os cavalos adoram maçãsĀ eĀ Insanos, estes dois Ćŗltimos, em 2023).Ā Como fotógrafo tem vĆ”rios livros publicados e integrou a iniciativaĀ Passado e Presente – Lisboa Capital Ibero-americana da Cultura 2017. Publicou em 2022 o seu primeiro livro infantil,Ā ConfinadosĀ (com ilustraƧƵes de Nuno Azevedo). Vive em Portugal desde 1991.

Rascunho