🔓 Flávia Rocha

Ensaio fotográfico de Flávia Rocha
Foto: Ozias Filho
01/01/2022

Liberdade, igualdade; e a fraternidade que nos falta. Um ideário que nunca se cumprirá enquanto deixar de fora da equação o fraterno que sempre foi o utópico de cada um de nós. Talvez este vazio da fraternidade, que não temos, explique melhor a trajetória do ser humano ao longo da história, e os seus constantes e repetidos atropelos. Talvez explique que duas grandes guerras, mais outros tantos conflitos diários, não foram suficientes para acalmar os ânimos de um ser humano que aparentemente tem no bélico o seu instinto natural.

Talvez elucide que, em meio a tantos outros dilemas, sejamos incapazes de resolver os dramas de todos aqueles sedentos de pão e casa. Talvez a falta de fraternidade esclareça de uma vez por todas o porquê de sermos incapazes de resolver as alterações climáticas, pois para isso é preciso que esqueçamos as nossas pequenas quizílias, e deixemos de lado o deus dinheiro. Sem a fraternidade, os outros dois conceitos serão voláteis, e nos deixarão as mãos cheias de água, algo que temos a sensação de que agarramos, mas que se nos escapa por entre os dedos.

A fraternidade vem como tema, na medida exata, quando tenho em mãos o mais recente livro, Exosfera, de Flávia Rocha. A poeta descreve por meio de uma personagem, um astronauta, todo o desencanto que lhe vai na alma. Estamos em 2121, e o planeta está pela hora da morte, agoniza um pouco a cada dia, se extingue com a mesma naturalidade em que se morre, e o nascimento agora reside na terra do utópico. O ser humano finalmente conseguiu com a sua “igualdade”, com a sua “liberdade” – de costas viradas ao outro – a falência do planeta.

A poeta, com a sua linguagem cifrada, experimental, dá bem a noção da falta de entendimento, de recursos, de soluções à vista. Estamos de fato na exosfera, na camada mais externa da atmosfera terrestre a partir da superfície, distantes o suficiente daquilo que nos mata e próximos de um espaço sideral que não garante a esperança. Somos este astronauta, ou a voz lírica de Flávia, leitores do desencanto, daquilo que se passa defronte dos nossos olhos, da extinção diária sem contemplações ou remédios possíveis.

Foto: Ozias Filho

Foto: Ozias Filho

Foto: Ozias Filho

Foto: Ozias Filho

Foto: Ozias Filho

Foto: Ozias Filho

Foto: Ozias Filho

Foto: Ozias Filho

Foto: Ozias Filho
Flávia Rocha
Nasceu em São Paulo (SP), em 1974. É jornalista, poeta e roteirista. Livros de poemas: Exosfera (Nós, 2021), Quartos habitáveis (Confraria do Vento, 2011), A casa azul ao meio-dia (Travessa dos Editores, 2009) e Um país (Confraria do Vento, 2005). Seus poemas, traduções e ensaios foram publicados em diversas revistas brasileiras e internacionais. Por 13 anos foi editora da revista literária americana Rattapallax. Trabalhou nas revistas Carta Capital, Bravo!, Casa Vogue e República. É fundadora e diretora de comunicação da Academia Internacional de Cinema (AIC), e corroteirista, com Steven Richter, do longa-metragem Birds of Neptune (EUA, 2015). Vive em Lisboa (Portugal). www.flaviarocha.com
Ozias Filho

Nasceu no Rio de Janeiro (RJ), em 1962. É poeta, fotógrafo, jornalista e editor. Autor de Poemas do dilúvio, Páginas despidas, O relógio avariado de Deus, Insulares, Os cavalos adoram maçãs e Insanos, estes dois últimos, em 2023). Como fotógrafo tem vários livros publicados e integrou a iniciativa Passado e Presente – Lisboa Capital Ibero-americana da Cultura 2017. Publicou em 2022 o seu primeiro livro infantil, Confinados (com ilustrações de Nuno Azevedo). Vive em Portugal desde 1991.

Rascunho