EcolĂłgico (a) leitor (a), nĂŁo sei se vocĂŞ vem acompanhando, mas sob o governo deste, Deus que me perdoe, presidente Jair Bolsonaro, onde todas as notĂcias sĂŁo as piores possĂveis, temos batido recordes atrás de recordes de desmatamento. E, nĂŁo por acaso, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, encontra-se sob investigação, suspeito de ter montado, a partir de seu gabinete, um balcĂŁo destinado a favorecer empresários em negĂłcios de desflorestamento e venda ilegal de madeira… Sim, querido (a) leitor (a), aqui neste paĂs, nada mais surpreende… Nem mesmo colocarem a raposa para tomar conta do galinheiro…
Em 2020, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), a taxa de desmatamento da AmazĂ´nia foi a maior dos Ăşltimos 20 anos — e, preste atenção, nĂłs estávamos em plena gangorra da pandemia, quando, sabemos, os negĂłcios, atĂ© mesmo os ilĂcitos, conheceram um arrefecimento. E a situação continua a piorar. Em abril deste ano, o desmatamento da regiĂŁo teve um salto de 42% em relação a março, registrando a maior área destruĂda no perĂodo de um mĂŞs, desde quando o monitoramento foi iniciado.
Assim tambĂ©m, a Mata Atlântica, que corria do Rio Grande do Norte ao Rio Grande do Sul, hoje reduzida a 7% da área original, continua a ser devastada. Segundo levantamento da SOS Mata Atlântica em conjunto com o Inpe, entre 2019 e 2020, a regiĂŁo perdeu o equivalente a 18 mil campos de futebol, 14% a mais do que o observado entre 2017 e 2018. E em 2020, vocĂŞ deve se lembrar, o Pantanal viveu a maior tragĂ©dia de sua histĂłria. Em julho daquele ano, o Inpe registrou 1.684 focos de incĂŞndio na regiĂŁo, e os rios atingiram o menor nĂvel em cinquenta anos.
Nunca Ă© demais lembrar que vivemos num precário equilĂbrio na Terra. O desmatamento nĂŁo afeta apenas os bichos e os povos da floresta, como vocĂŞ, talvez, incauto (a) leitor (a), possa imaginar. Ele afeta a sua vida — e, mais ainda, a de seus descendentes. Sem floresta, nĂŁo há água e, como vocĂŞ sabe, sem água nĂŁo há vida. Portanto, nĂłs, que pertencemos aos 80% da população brasileira que moram na cidade, devemos nos preocupar sim com o que acontece nas florestas, que muitas vezes percebemos como algo tĂŁo longĂnquo quanto Marte. Se nĂŁo fizermos algo, urgentemente, nĂŁo será apenas a fauna e a flora selvagens extintas — mas a prĂłpria Humanidade.
Luz na escuridĂŁo
Ronaldo Werneck, poeta, cronista, ensaĂsta:
“Finalizo o livro Cataguases SĂ©culo XX / antes & depois, panorama histĂłrico-cultural, focado na cidade modernista — literatura, cinema, arquitetura — e abrindo tambĂ©m espaço para a cidade geográfica e seu sĂtio habitado, a historicidade: a cidade-cidadĂŁ, cotidiana, comunitária. Mas, afora seus monumentos modernos — de ferro e fita, de pedra e tinta — a cidade vive mesmo Ă© no compasso de suas gentes. E nĂŁo há como abordá-la sem que sejam conectados os fios onde a vida pulsa. Reencontro uma Cataguases de sĂ©culos pela voz de quem mais sabe. Quem mais habilitado para contar essa histĂłria que Ă© sua prĂłpria histĂłria? Quem mais autorizado, quem mais autoridade que essa gente, essas gentes? Passaram todos por aqui, revelados e se revelando em sua essĂŞncia de personagens-fundadores. Urbe e civita. Quem senĂŁo esses nomes cujas vidas se imbricam para formatar uma sĂł vida, uma sĂł vera/cidade?”
Parachoque de caminhĂŁo
“A compaixão é uma forma de amor e, de fato, a sua maior expressão.”
Isaac Bashevis Singer (1904-1991)
Antologia pessoal da poesia brasileira
Carlos Pena Filho
(Recife, PE – 1929-1960)
A solidĂŁo e sua porta
A Francisco Brennand
Quando mais nada resistir que valha
a pena de viver e a dor de amar
e quando nada mais interessar,
(nem o torpor do sono que se espalha)
Quando, pelo desuso da navalha
a barba livremente caminhar
e até Deus em silêncio se afastar
deixando-te sozinho na batalha
a arquitetar na sombra a despedida
do mundo que te foi contraditĂłrio,
lembra-te que afinal te resta a vida
com tudo que Ă© insolvente e provisĂłrio
e de que ainda tens uma saĂda:
entrar no acaso e amar o transitĂłrio.
(Livro geral, 1959)