Capítulo 11: O faquir sertanejo
Eram quase cinco horas da tarde, momentos de suspense diante da cova, em minutos iria começar o desenterro do Faquir. Eu estava ao lado de meu pai, junto também Urias e Barril. Meu pai trazia um revólver por dentro da camisa; em casa eu tinha percebido seus movimentos preventivos. Mamãe e Martinha não vieram testemunhar o acontecimento, não aprovavam aquela encenação, achavam um despropósito a prefeitura gastar dinheiro com essa barbaridade.
Na hora marcada começou a delicada e demorada operação de retirar a terra com as ferramentas sem macular o caixão e, depois, com ajuda de cordas, alçá-lo à borda do buraco. Nenhum ruído vinha de dentro do esquife e era chegado o momento de suspense máximo: a abertura do caixão. A consternação foi geral. Lá estava o homem morto. O corpo estendido de bruços foi saudado por murmúrios doloridos. “Ele se debateu antes de morrer”, alguém comentou. “Pobre homem, foi abandonado por São Lázaro e Jesus Cristo”, outra voz pranteava. Não era o desfecho desejado!
Mas o corpo de bruços e inerte durante longos segundos era uma técnica de suspense, fazia parte da encenação. Pois, vencido esse tempo eterno de consternação, o faquir se virou e sentou-se dentro do caixão, espichou a espinha, estirou os braços e puxou fundo uma golfada de ar, durante quase um minuto, como se estivesse recuperando para o corpo todo o ar exaurido embaixo da terra. Um suspiro geral de espanto escapou das gargantas. Após a respiração primal, recuperado, o faquir soltou um exagerado bocejo, encerrando, enfim, o sono hibernal de vinte e quatro horas. Manifestando o desejo de matar a sede, tomou o rumo do bar do Sendão, levando atrás de si a multidão, como se entoasse uma melodia encantada numa flauta invisível. Depois, com os cotovelos apoiados no balcão e sorvendo uns goles de guaraná, a quem perguntava do seu estado reclamava de uma leve enxaqueca, aliás prejudicada pela claridade que lhe machucava os olhos, apesar da mansidão da luz naquele fim de tarde.