Versos de fé

Adélia Prado: "A que me inscreve na minha humanidade, confortando-a ou perturbando-a."
Adelia Prado, autora de “Solte os cachorros “
01/10/2014

Adélia Luzia Prado de Freitas, ou somente Adélia Prado, nasceu na cidade interiorana de Divinópolis (MG), em 1935. Iniciou os estudos no Grupo Escolar Padre Matias Lobato e finalizou-os no Ginásio Nossa Senhora do Sagrado Coração, entrando, em seguida, para o magistério. Em 1950, tocada pela morte da mãe, escreveu seus primeiros versos. Formou-se em filosofia pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Divinópolis. Seus primeiros poemas foram publicados no livro A lapinha de Jesus, em parceria com Lázaro Barreto. Sua estreia solo, porém, foi aos 40 anos, com Bagagem, em 1976, sob os auspícios de Carlos Drummond de Andrade. Dois anos depois, com O coração disparado, vence o Prêmio Jabuti de melhor livro de poesia. Ingressou na prosa com o livro de contos Solte os cachorros e com o romance Cacos para um vitral, em 1980. Em 1991, lançou sua Poesia reunida e, em 1999, sua Prosa reunida. Também já passou pelo gênero infantil com os livros Quando eu era pequena e Carmela vai à escola. Este ano, pelo conjunto de sua obra poética, foi laureada com o The Griffin Trust for Excellence in Poetry’s Lifetime Recognition, prêmio oferecido pela instituição canadense Griffin Trust. Sua mais recente publicação é o livro de poemas Miserere, no qual, em quatro segmentos, segue a linha religiosa que sustenta seus versos. 

Quando se deu conta de que queria ser escritora?
Me lembro de ter uma fantasia de escritora na adolescência, quando então iria escrever um livro com o horrível título Vagalumes e pirilampos.

• Quais são suas manias e obsessões literárias?
Não tenho.

Que leitura é imprescindível no seu dia-a-dia?
A que me inscreve na minha humanidade, confortando-a ou perturbando-a.

• Se pudesse recomendar um livro à presidente Dilma, qual seria?
Mulheres que correm com os lobos [de Clarissa Pinkola Estés].

• Quais são as circunstâncias ideais para escrever?
Quando somos atacados pela urgência deliciosa de nos expressarmos, esta é a hora.

• Quais são as circunstâncias ideais de leitura?
Desejo, recolhimento (atenção real).

O que considera um dia de trabalho produtivo?
O dia em que se vai dormir sem culpa.

• O que lhe dá mais prazer no processo de escrita?
O processo em si.

Qual o maior inimigo de um escritor?
O ego.

O que mais lhe incomoda no meio literário?
A atrocidade de polêmicas e disputas, competições. O ego de novo.

Um autor em quem se deveria prestar mais atenção.
Tem muita gente formidável. Nenhum autor terá todos os leitores. Um leitor não dá conta de todas as obras-primas. Acho que escolhemos alguns que farão parte sempre de nossa “família espiritual”. Afinal, tem que nos sobrar tempo para viver apenas.

Um livro imprescindível e um descartável.
Imprescindível é o que você relê sempre. Descartável, o que morre na estreia.

Que defeito é capaz de destruir ou comprometer um livro?
A intromissão do autor no texto, se mostrando ao leitor. O que não dá sossego aos personagens, o que deixa à mostra os andaimes da obra, o didático, o ideológico, o engajado, o catequético.

Que assunto nunca entraria em sua literatura?
Qualquer coisa é a casa da poesia.

Qual foi o canto mais inusitado de onde tirou inspiração?
Uma casinha recém-construída, estalando de nova. O sol quase rachava a casa e a rua, de tão quente. Eu não queria morar ali. A casa e a rua me recusavam, mas alguma coisa no fenômeno me perturbou muito. Era bom e ruim ao mesmo tempo. Virou texto e eu sosseguei.

Quando a inspiração não vem…
Eu espero.

• Qual escritor — vivo ou morto — gostaria de convidar para um café?
Qualquer um que tomando café não fale de literatura.

O que é um bom leitor?
O que adora ler.

O que te dá medo?
A morte.

O que te faz feliz?
A fé na vida eterna. Na ressurreição.

Qual dúvida ou certeza guia seu trabalho?
Ambas, guiadas pela necessidade de dizê-las.

• Qual a sua maior preocupação ao escrever?
De fazer um texto onde a poesia não compareça.

A literatura tem alguma obrigação?
De jeito nenhum. Só o de ser ela mesma.

Qual o limite da ficção?
Ficção tem limite?

• Se um ET aparecesse na sua frente e pedisse “leve-me ao seu líder”, a quem você o levaria?
Não levaria ao meu líder, mas ao meu salvador, Jesus Cristo.

• O que você espera da eternidade?
O enamoramento infinito, fora do tempo e do espaço. A duração perpétua de um agora.

Leia resenha de Miserere, seu mais recente livro de poemas

Rascunho

Rascunho foi fundado em 8 de abril de 2000. Nacionalmente reconhecido pela qualidade de seu conteúdo, é distribuído em edições mensais para todo o Brasil e exterior. Publica ensaios, resenhas, entrevistas, textos de ficção (contos, poemas, crônicas e trechos de romances), ilustrações e HQs.

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