O escritor e crítico literário catarinense Carlos Henrique Schroeder se deu conta de que seria escritor na adolescência, quando passou a se sentir mais feliz ao lado dos livros do que das pessoas. Nessa jornada, dedica-se à leitura do mundo e em descobrir e ler os autores preferidos de seus próprios autores de cabeceira, gerando uma “grande e prazerosa rede de descobertas”. Estreou na literatura com Ensaio do vazio (2006), que ganhou uma versão em quadrinhos em 2012. Pelos contos de As certezas e as palavras, de 2010, ganhou Prêmio Clarice Lispector, da Fundação Biblioteca Nacional. Como romancista, lançou As fantasias eletivas (2014), adaptado para o cinema, e História da chuva (2015). Seu livro mais recente é Aranhas (2020), novamente na narrativa breve.
• Quando se deu conta de que queria ser escritor?
Na adolescência. Quando passei a me sentir mais feliz ao lado dos livros do que das pessoas.
• Quais são suas manias e obsessões literárias?
Descobrir e ler os autores preferidos dos meus autores prediletos. E isso me leva a uma espiral sem fim, uma grande e prazerosa rede de descobertas.
• Que leitura é imprescindível no seu dia a dia?
A de mundo. Escutar e ver, tentar entender o micro e o macro, os contextos históricos, sociais e econômicos.
• Se pudesse recomendar um livro ao presidente Jair Bolsonaro, qual seria?
O parque das irmãs magníficas, da Camila Sosa Villada. Quem sabe ele aprenderia o significado da palavra alteridade e o que ela representa.
• Quais são as circunstâncias ideais para escrever?
No silêncio absoluto, com uma boa xícara de café.
• Quais são as circunstâncias ideais de leitura?
Eu gosto muito de ler deitado. Esparramado na cama ou no sofá ou mesmo no tapete da sala.
• O que considera um dia de trabalho produtivo?
Quando o romance avança e você se desfaz daquele nó que estava travando tudo, ou quando encontra o ponto final de um conto. Ambos são raros.
• O que lhe dá mais prazer no processo de escrita?
Descobrir novas facetas dos personagens. Ter essas epifanias quando menos espero.
• Qual o maior inimigo de um escritor?
O desleixo. Com a linguagem ou com a trama ou com os personagens ou com os diálogos. O desleixo está sempre à espreita, esperando uma ocasião para avacalhar com o texto.
• O que mais lhe incomoda no meio literário?
A hipocrisia. As redes sociais criaram uma geração de escritores com discursos que servem à sua imagem. Ou ao mercado. Gosto mesmo é de uma utopia: daqueles abnegados que são serviçais exclusivos da leitura e da escritura.
• Um autor em quem se deveria prestar mais atenção.
Caléu Moraes. Engraçado como o diabo, triste como deus. Enciclopédico como o Vila-Matas.
• Um livro imprescindível e um descartável.
A morte de Virgílio, do Hermann Broch, considero imprescindível por alcançar com maestria tudo a que se propõe. E A trama do casamento, do Jeffrey Eugenides, considero descartável por tudo que poderia ter sido e não é.
• Que defeito é capaz de destruir ou comprometer um livro?
Arritmia. Ou falta de ritmo. Não há tema ou personagem que sobrevivam a uma série de solavancos em uma narrativa.
• Que assunto nunca entraria em sua literatura?
Nenhum. Não tenho pudores literários.
• Qual foi o canto mais inusitado de onde tirou inspiração?
Do cheiro da parafina de uma prancha de surfe. Inspirou um conto inteiro.
• Quando a inspiração não vem…
Leio, vejo um filme, escuto música. Sempre ajuda. Mas algo que funciona muito bem comigo é dar uma boa caminhada. Volto arejado.
As redes sociais criaram uma geração de escritores com discursos que servem à sua imagem. Ou ao mercado.
• Qual escritor — vivo ou morto — gostaria de convidar para um café?
Para um café, o Roberto Bolaño ou a Maria Gabriela Llansol. Para uma caminhada, o Robert Walser.
• O que é um bom leitor?
Aquele que procura sair da sua zona de conforto e assim descobre, sozinho, a sua biblioteca interior.
• O que te dá medo?
Lançamentos presenciais dos meus livros. Medo de não ir ninguém. De dar tudo errado. De eu ter um ataque de pânico.
• O que te faz feliz?
Viajar. E não precisa ser para longe. Adoro descobrir novas ruas, comidas, livrarias, cheiros.
• Qual dúvida ou certeza guiam seu trabalho?
A certeza de que quanto mais escrevo e publico, mais dúvidas tenho sobre meu próprio trabalho.
• Qual a sua maior preocupação ao escrever?
Na verdade, quando estou no gesto da escrita, só me preocupo com as idiossincrasias daquele universo textual, em dar permanência ao impermanente. Cada texto gera um tipo de preocupação. Mas textual. E não sobre algum fator externo.
• A literatura tem alguma obrigação?
Não.
• Qual o limite da ficção?
Nenhum. Sem limites, margens ou obrigações.
• Se um ET aparecesse na sua frente e pedisse “leve-me ao seu líder”, a quem você o levaria?
Supondo que pudéssemos viajar no tempo, poderíamos visitar o uruguaio Felisberto Hernández.
• O que você espera da eternidade?
Que acabe.