O rigor estético dos manusgrifos

Margarida Patriota: “Bom leitor é o que gosta de ler, o que encara a leitura como experiência gratificante”
Margarida Patriota, autora de “Reverências de corpo ausente”
01/06/2024

A carioca Margarida Patriota dedica sua vida à literatura. Seja como professora de Teoria da Literatura na Universidade de Brasília (UnB), onde atuou por 28 anos, ou como tradutora e autora de livros de ficção e poesia.

Com quase 30 livros publicados, ela escreveu em vários gêneros: do ensaio ao infantojuvenil; da poesia ao conto. O mais recente trabalho de Margarida é Reverências de corpo ausente, sua terceira coletânea de poemas, lançada em 2023.

Durante duas décadas, comandou o programa de entrevistas Autores e livros, da Rádio Senado Federal, onde entrevistou nomes como Rachel de Queiroz, Moacyr Scliar, Carlos Heitor Cony, Adélia Prado e João Ubaldo Ribeiro.

Em 2003, recebeu o prêmio da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ) por sua tradução de O fantasma da ópera.

A escritora morou na Suíça, Estados Unidos, América Central e Canadá antes do regresso definitivo ao Brasil. Nesta edição do Inquérito, ela revela alguns de seus autores favoritos, entre eles Henry James e Machado de Assis, maneirismos estilísticos (como seus “manusgrifos”), além de outros detalhes de sua rotina como leitora e escritora.

• Quando se deu conta de que queria ser escritora?
Em torno dos quinze, dezesseis anos.

• Quais são suas manias e obsessões literárias?
Escrever inicialmente a lápis, enchendo a página de grafismos que chamo de “manusgrifos”.

• Que leitura é imprescindível no seu dia a dia?
Leitura de notícias e de algo de cunho poético.

• Se pudesse recomendar um livro ao presidente Lula, qual seria?
Ele talvez gostasse do ambiente e dos personagens de A morte e a morte de Quincas Berro d’Água, de Jorge Amado.

• Quais são as circunstâncias ideais para escrever?
Estar a sós e ter o dia à minha disposição.

• Quais são as circunstâncias ideais de leitura?
Um estofado confortável e silêncio à volta.

• O que considera um dia de trabalho produtivo?
Aquele em que avanço bem na tentativa de expressar o que desejo.

• O que lhe dá mais prazer no processo de escrita?
O surgimento da ideia e o polimento do texto.

• Qual o maior inimigo de um escritor?
Como em tudo, a desonestidade. A perda da integridade em nome das conveniências.

• O que mais lhe incomoda no meio literário?
Certo intelectualismo forçado.

• Um autor em quem se deveria prestar mais atenção.
Lourenço Cazarré.

• Um livro imprescindível e um descartável.
Imprescindíveis para mim: As flores do mal, de Baudelaire; Guerra e paz, de Tolstói; Memórias póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis. Descartáveis para mim: Memórias sentimentais de João Miramar, de Oswald de Andrade, e Cobra Norato, de Raul Bopp.

• Que defeito é capaz de destruir ou comprometer um livro?
A prolixidade ou o seu inverso, o laconismo, a apelação barata e o descuido da forma em nome da oralidade.

• Que assunto nunca entraria em sua literatura?
Não saberia lidar com o escatológico e o mundo reduzido à pregação de um viés político partidário.

• Qual foi o lugar mais inusitado de onde tirou inspiração?
Numa piscina, nadando embaixo d’água.

• Quando a inspiração não vem…
Espero quieta ou então leio, quando consigo deixar de lado a busca da inspiração.

• Qual escritor — vivo ou morto — gostaria de convidar para um café?
Ih, muitos! De início, penso que Stendhal, Henry James, Proust e Agatha Christie me renderiam bons papos.

• O que é um bom leitor?
Bom leitor é o que gosta de ler, o que encara a leitura como experiência gratificante.

• O que te dá medo?
Guerra, violência.

• O que te faz feliz?
Riso de criança e um sem número de coisas.

• Qual dúvida ou certeza guiam seu trabalho?
A dúvida quanto a quem me dirijo e a certeza de que primeiramente a mim.

• Qual a sua maior preocupação ao escrever?
Atender a meus padrões estéticos.

• A literatura tem alguma obrigação?
Obrigação, propriamente, não, mas a literatura só existe do momento em que estabelece comunicação entre dois seres.

• Qual o limite da ficção?
A não-ficção que a sobrepuja.

• Se um ET aparecesse na sua frente e pedisse “leve-me ao seu líder”, a quem você o levaria?
Pessoas que eu amo me lideram, eu levaria o ET a uma delas.

• O que você espera da eternidade?
Que seja eterna, ou não será eternidade.

Reverências de corpo ausente
Margarida Patriota
7Letras
86 págs.
Rascunho

Rascunho foi fundado em 8 de abril de 2000. Nacionalmente reconhecido pela qualidade de seu conteúdo, é distribuído em edições mensais para todo o Brasil e exterior. Publica ensaios, resenhas, entrevistas, textos de ficção (contos, poemas, crônicas e trechos de romances), ilustrações e HQs.

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