Mineira de Belo Horizonte, Cidinha da Silva nasceu em 1967 e atualmente vive em São Paulo (SP). Formada em História pela Universidade Federal de Minas Gerais, descobriu por volta dos 10 anos que queria ser escritora. Estreou como cronista em 2007, com Cada tridente em seu lugar e outras crônicas e publicou, entre outros, Sobre-viventes (2016) e Racismo no Brasil e afetos correlatos (2013). Além de suas obras infantojuvenis e de ter organizado livros de não ficção, já participou de vários projetos que promovem ações afirmativas e discutem questões raciais e de gênero. Seus livros mais recentes, ambos de 2018, são O homem azul do deserto e Um exu em Nova York.
• Quando se deu conta de que queria ser escritora?
Muito cedo, criança ainda, por volta dos 10 anos. Ao ler os cronistas mineiros, Drummond, Fernando Sabino e Paulo Mendes Campos, tive vontade de escrever minhas próprias histórias.
• Quais são suas manias e obsessões literárias?
Manias: tenho muitos cadernos completos e guardo todos. Coleciono cadernos novos e bonitos que serão usados e guardados. Guardo muitas canetas também e boa parte delas não escreve. Uma obsessão, propriamente, não consigo identificar agora.
• Que leitura é imprescindível no seu dia a dia?
Noticiário político.
• Se pudesse recomendar um livro ao presidente Jair Bolsonaro, qual seria?
Quarto de despejo, de Carolina Maria de Jesus.
• Quais são as circunstâncias ideais para escrever?
Um lugar arejado e silencioso ou com a música que eu queira ouvir naquele momento. Uma cadeira confortável e espaço para manusear anotações em papel e livros que eu queira consultar.
• Quais são as circunstâncias ideais de leitura?
Silêncio, uma cadeira confortável ou minha cama. Gosto de ler ao ar livre, em parques, ou numa varanda que dê para o rio Paraguaçu, no Recôncavo da Bahia.
• O que considera um dia de trabalho produtivo?
Quando consigo cumprir boa parte do que planejei para realizar naquele dia.
• O que lhe dá mais prazer no processo de escrita?
Muitas coisas. Gosto muito quando o que escrevi me emociona, gosto mais ainda quando a emoção continua a acontecer com o passar do tempo. Gosto muito de limpar o texto e do exercício de afinação da poética, de transformar parágrafos mais longos e descritivos em imagens ou textos mais curtos com ritmo, cadência e beleza. Adoro receber o livro da editora, manuseá-lo como objeto e concluir que está bonito e bem-feito.
• Qual o maior inimigo de um escritor?
A falta de tempo e espaço criativos.
• O que mais lhe incomoda no meio literário?
As igrejinhas, os clubinhos, as panelas, os clãs.
• Um autor em quem se deveria prestar mais atenção.
Uma autora: Tatiana Nascimento, poeta de Brasília.
• Um livro imprescindível e um descartável.
Imprescindível: Niketche, uma história de poligamia, Paulina Chiziane. Descartável: toda a produção do Olavo de Carvalho.
• Que defeito é capaz de destruir ou comprometer um livro?
Muitos: texto literário prolixo; didático; pretensioso (julga dizer coisas mirabolantes e não consegue dizer o básico); gente que escreve e não sabe a hora de parar, tampouco como parar (fechar um texto). Um texto sem revisão também está condenado à morte, bem como aqueles mal diagramados, cuja leitura se torna irritante, e os mal encadernados que vão se desmanchando à medida que a gente lê.
• Que assunto nunca entraria em sua literatura?
Não sei, acho que todos os assuntos podem entrar. O grande desafio é conseguir tratar certos temas de maneira literária.
• Qual foi o canto mais inusitado de onde tirou inspiração?
Como cronista que sou, meu exercício mais frequente é o de destacar o inusitado nas situações comuns.
• Quando a inspiração não vem…
De um modo geral, não acredito nela. Eu me sento para escrever e escrevo. Se não consigo escrever, reviso o que já foi escrito, passo em revista as anotações, trabalho o texto.
• Qual escritor — vivo ou morto — gostaria de convidar para um café?
Ana Maria Gonçalves.
• O que é um bom leitor?
Alguém que interpreta o que lê e faz sua própria viagem.
• O que te dá medo?
Em literatura? Escrever um texto medíocre parecido com os textos que considero medíocres. Fora da literatura: ruas desertas e sem iluminação pelas quais eu precise passar. Ratos, os roedores e os humanos.
• O que te faz feliz?
Amar e ser amada. Escrever, porque escrever me dá alegria. Este é o motivo principal de ser escritora.
• Qual dúvida ou certeza guiam seu trabalho?
A certeza de que a expressão pela escrita é minha melhor forma de expressão, de comunicação com o mundo e de criação dos mundos que me interessam.
• Qual a sua maior preocupação ao escrever?
Produzir um texto limpo que possibilite a compreensão a quem me lê.
• A literatura tem alguma obrigação?
Para mim, sim. “Escrever bem” é uma obrigação de quem escreve profissionalmente.
• Qual o limite da ficção?
Para mim são os processos desumanizadores. Posso, por exemplo, construir uma personagem que estupra, mas não consigo e não posso brincar com o estupro, não posso diminuir ou esvaziar sua crueldade e deixar frouxos indícios que levem a sua legitimação.
• Se um ET aparecesse na sua frente e pedisse “leve-me ao seu líder”, a quem você o levaria?
Sueli Carneiro.
• O que você espera da eternidade?
Uma vida mais tranquila, com mais tempo pra conversa, flores e passarinhos. Se na eternidade tiver comida, boa comida e bebida também.