Poemas de W. H. Auden

Leia os poemas traduzidos "A beleza lunar", "Maio", "Edward Lear", "Epitáfio para um Tirano" e "A canção"
Wystan Hugh Auden, poeta anglo-americano
01/04/2024

Tradução e seleção: André Caramuru Aubert

The lunar beauty

This lunar beauty
Has no history,
Is complete and early;
If beauty later
Bear any feature
It had a lover
And is another.

This like a dream
Keeps other time,
And daytime is
The loss of this;
For time is inches
And the heart’s changes
Where ghost has haunted,
Lost and wanted.

But this was never
A ghost’s endeavour
Nor, finished this,
Was ghost at ease;
And till it pass
Love shall not near
The sweetness here
Nor sorrow take
His endless look.

A beleza lunar

Esta beleza lunar
Não tem história
É completa e ancestral;
Se a beleza mais tarde
Adquirir algum traço
Ela teve um amante
E é outra.

Esta, como um sonho,
Carrega um outro tempo,
E o dia traz
A perda disso;
Porque o tempo é centímetros
E as mudanças no coração
Onde o espírito assombrou,
Desaparecido e desejado.

Mas isso nunca foi
O empreendimento de um espírito
Nem, tendo tudo terminado,
Ficou o espírito relaxado;
E até que tudo passe
O amor não virá
Da doçura que aqui há
Nem a tristeza arrancará
Seu olhar infinito.

May

May with its light behaving
Stirs vessel, eye and limb,
The singular and sad
Are willing to recover,
And to each swan-delighting river
The careless picnics come
In living white and red.

Our dead, remote and hooded,
In hollows rest, but we
From their vague woods have broken,
Forests where children meet
And the white angel-vampires flit,
Stand now with shaded eye,
The dangerous apple taken.

The real word lies before us,
Brave motions of the young
Abundant wish for death,
The pleasing, pleasured, haunted:
A dying Master sinks tormented
In his admirers’ ring,
The unjust walk the earth.

And love that makes impatient
Tortoise and roe, that lays
The blonde beside the dark,
Urges upon our blood,
Before the evil and the good
How insufficient is
Touch, endearment, look.

Maio

Maio com sua luz parecendo
Navios a balançar, olhos e membros
O que é triste e singular
Em busca de sarar,
E para cada rio em que se deliciam os cisnes
Piqueniques preguiçosos
Em vívidos vermelhos e brancos.

Nossos mortos, distantes e encapuzados,
Repousam em covas, mas nós
De suas vagas florestas rompemos
Matas onde crianças se encontram
E brancos anjos-vampiros voam,
Permanecem agora com os olhos escuros,
Já colhida a maçã perigosa.

O mundo real diante de nós,
Bravas ações dos que são jovens
Em abundante desejo por morte,
O agradável, prazeroso, assombrado:
Um Mestre atormentado morrendo afogado
No anel de quem o admira,
Os condenados caminham pela terra.

E o amor que deixa impacientes
As ovas e a tartaruga, que depositam
O que é loiro junto à treva,
Exortam nosso sangue,
Diante do bem e do mal
Quão insuficientes são
O toque, a ternura, o olhar.

Edward Lear

Left by his friend to breakfast alone on the white
Italian shore, his Terrible Demon arose
Over his shoulder; he wept to himself in the night,
A dirty landscape-painter who hated his nose.

The legions of cruel inquisitive They
Were so many and big like dogs: he was upset
By Germans and boats; affection was miles away:
But guided by tears he successfully reached his Regret.

How prodigious the welcome was. Flowers took his hat
And bore him off to introduce him to the tongs;
The demon’s false nose made the table laugh; a cat
Soon had him waltzing madly, let him squeeze her hand;
Words pushed him to the piano to sing comic songs;

And children swarmed to him like settlers. He became a land.

Edward Lear[1]

Deixado por seu amigo para tomar café da manhã sozinho
No branco litoral italiano, seu Demônio Terrível se ergueu
Sobre seus ombros; ele lamentou para si à noite,
Um sujo pintor de paisagens que detestava o próprio nariz.

As legiões de inquisidores cruéis Eles
Eram muitos e enormes como cães: ele vivia irritado
Com alemães e navios; o afeto estava a milhas de distância:
Mas guiado pelas lágrimas ele pôde alcançar seu Arrependimento.

Quão prodigiosa foi a recepção. Flores invadiram seu chapéu
E o aborreceram para apresentá-lo às tenazes;
O nariz falso do demônio fez a mesa rir; um gato
Logo o levaria a dançar loucamente, a apertar sua mão;
Palavras levaram-no ao piano para cantar canções engraçadas;

E crianças voaram em enxames para ele. Ele se tornou uma terra.

Epitaph on a Tyrant

Perfection, of a kind, was what he was after,
And the poetry he invented was easy to understand;
He knew human folly like the back of his hand,
And was greatly interested in armies and fleets;
When he laughed, respectable senators burst with laughter,
And when he cried the little children died in the streets.

Epitáfio para um Tirano

A perfeição, de algum modo, era o que ele buscava,
E a poesia que criou era fácil de entender;
Ele conhecia as loucuras humanas como a palma de sua mão,
E se interessava imensamente por exércitos e esquadras;
Quando ria, honoráveis senadores explodiam em gargalhadas,
E, quando berrava, criancinhas morriam pelas ruas.

The song

So large a morning so itself to lean
Over so many and such little hills
All at rest in roundness and rigs of green
Can cope with a rebellious wing that wills
To better its obedient double quite
As daring in the lap of any lake
The wind from which ascension puts to flight
Tribes of a beauty which no care can break.

Climbing to song it hopes to make amends
For whiteness drabbed for glory said away
And be immortal after but because
Light upon a valley where its love was
So lacks all picture of reproach it ends
Denying what it started up to say.

A canção

Tão vasta manhã, tão própria a se recostar
Sobre tantas e tão pequenas colinas
Todas repousando em bordas e encostas de verde
Capaz de lidar com uma ala rebelde que quer
Melhorar o bastante seu obediente duplo
Como se relaxando no seio de um lago
E o vento que ao se elevar põe para voar
Tribos de tal beleza que nenhum cuidado quebraria.

Escalando rumo à música, ela espera fazer as pazes
Pois a brancura desbotada pela glória foi dita
E se tornar depois imortal porque
A luz sobre o vale era onde o seu amor estava
Não havendo imagem de censura ela termina
Negando o que havia começado a dizer.

Nota
[1] Embora esse não seja um dos poemas mais conhecidos de Auden, decidi incluí-lo aqui por puro nepotismo, porque homenageia meu tio-tetravô Edward Lear (1812-1888), poeta dos limericks, inventor do nonsense, desenhista de cartuns com figuras caricatas e gatos, pintor de paisagens e adorado pelas crianças de seu tempo. O lugar favorito de Lear era a Ligúria, no litoral noroeste da Itália, onde viveu seus últimos anos.

Wystan Hugh Auden
Nasceu em York (Inglaterra), em 1907. É considerado por quase toda a crítica como o “terceiro” dos grandes modernistas britânicos (depois de Yeats e Eliot). Seus poemas, por vezes obscuros, quase sempre falam, de uma maneira ou de outra, de amor. Morreu em Viena (Áustria), em 1973.
André Caramuru Aubert

Nasceu em 1961, São Paulo (SP). É historiador formado pela USP, editor, tradutor e escritor. Autor de Outubro/DezembroA vida nas montanhas e Cemitérios, entre outros.

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