rasgar o poema
a pele
a delicadeza
é minha natureza de bicho
eu bicho que cheira corre
e rasga aranha
arranha risca
afasta
o gato que dá um tapa com garras
tanta força na patinha
um peso, um chão
entre os dedos
terra
aterrar a delicadeza
rasga a boca
a pele
deixar os ossos
que se batam
desengonçada
sem domar o gesto
sem domar a fúria
não deixo mais
gesto alto e grave e fundo
até os seus ossos gelarem
frios ossos os meus
trepidar terra pedra e grito
tatuar a pele
soltar a
a voz
e se deixar cair
de bruta
mas como romper a delicadeza
quando nessa manhã dancei no chão
e lembrei do eu bicho
essa fera que não está pra sorriso
nem pra ouvir muito
ela olha atenta
e não se abre
não é toda ouvidos
nem toda espanto
é uma escuta seletiva
pra sobrevivência
soltar a voz
no voo
se deixar cair
vibro hoje sem delicado gesto
forte rápida a patinha do gato que puf dá soco porque
não é força é energia
é um raio de concentração
um raio de gato vida
um gato que se sabe raio
um gato que se sabe gato
não vai querer nada com alguém que não lhe diga
amor
amigo sossego bicho fúria
não vou responder aos teus olhos
fecho ouvidos e espanto pro mundo
para eu ser eu
sem delicadeza sem
isso que perde
a minha vida
…
vaga-lumes atravessam a noite
el oxígeno
atravessa a noite
litros y litros
faros de camión
faróis
luzes na noite
caminhões gordos de ar
inflam pulmões
vidas
en la noche de
vaga
lumes
las luciérnagas
mira
cómo emiten
luz
en la carretera
no se apagan
luz na noite
outros aires
quando o ar daqui
já está pesado demais
quando a terra não é mais casa
e o pulmão não é mais casa
oxígeno, sí, vivir
y todas las vidas
viven
e quando já não se pode viver
pero sí, se puede
vivir
quando ar
não há
que venha
el aire