Intervalo
naquele tempo
em que ainda se via o mato crescer
por entre as chuvas da janela
nas tardes compridas
de sol distante
meu pai tentava evitar os gols
em até três jogos por dia
“não havia mais o que fazer”
ele diz com uma saudade
que ofusca três segundos da TV
já logo volta o programa, a casa abafada,
um aperto de móveis
e sonhos escondidos com as louças sempre novas
e o velho enxoval nunca mais usado
do tempo em que o futebol
era a vida
as fotos só permitem
sentir a falta
esse não volta mais
sussurra seu suspiro enfarado…
antes do segundo tempo
há cada vez mais comerciais
…
O marceneiro cansado
meu pai
sente o peso da vida
ao ninar a neta no colo
ele não pode se mexer
nem saber
quando tudo começou
apenas se sente vivo
entre nuvens pesadas que escurecem a cozinha
e a terra imensa que guarda a infância longínqua
no cheiro da chuva
e da madeira