Poemas de Cristina Campo

Leia os poemas traduzidos "sem titulo", "Caderneta", "sem titulo", "sem titulo", "sem titulo" e "sem titulo"
Ilustração: Eduardo Mussi
01/12/2022

Devota come ramo
curvato da molte nevi
allegra come falò
per colline d’oblio,

su acutissime làmine
in bianca maglia d’ortiche,
ti insegnerò, mia anima,
questo passo d’addio…

Devota como ramo
curvado por muita neve
alegre como fogueira
por colinas de oblívio,

sobre amolada lâmina
em branca malha de urtigas,
te ensinarei, alma minha,
este passo do adeus…

Quadernetto

Un anno…Tratteneva la sua stella
il cielo dell’Avvento. Sulla bocca
senza febbre o paura la mia mano
ti disegnava, oscura, una parola.
E la sfera dell’anima e dell’anno
vibrava in cima a uno zampillo d’oro
alto e sottile, il sangue.
Ne tremavano
sorridenti gli sguardi — all’accostarsi
buio di quel guardiano incorrutibile
che nei giardini chiude le fontane.

Caderneta

Um ano… Apresava a sua estrela
o céu do Advento. Por sobre a boca
sem febre nem pavor a minha mão
te desenhava, escura, uma palavra.
E a esfera da alma e também do ano
vibrava acima dum repuxo de ouro
alto e sutil, o sangue.
Tiritavam
ridentes os olhares — ao chegar-se
sombrio do guarda incorruptível
que nos jardins estanca os chafarizes.

,,,

Amore, oggi il tuo nome
al mio labbro è sfuggito
come al piede l’ultimo gradino…

Ora è sparsa l’acqua della vita
e tutta la lunga scala
è da ricominciare.

T’ho barattato, amore, con parole.

Buio miele che odori
dentro i diafani vasi
sotto mille e seicento anni di lava —

ti riconoscerò dall’immortale
silenzio.

Amor, hoje o teu nome
ao meu lábio escapou
como ao pé o último degrau…

Esparsa agora é a água da vida
e toda a longa escada
é de recomeço.

A ti troquei, amor, com palavras.

Negro mel que recende
dentro dos diáfanos vasos
sob mil e seiscentos anos de lava —

reconhecer-te-ei pelo imortal
silêncio.

Ora rivoglio bianche tutte le mie lettere,
inaudito il mio nome, la mia grazia richiusa;
ch’io mi distenda sul quadrante dei giorni,
riconduca la vita a mezzanotte.

E la mia valle rosata dagli uliveti
e la città intricata dei miei amori
siano richiuse come breve palmo,
il mio palmo segnato da tutte le mie morti.

O Medio Oriente disteso dalla sua voce,
voglio destarmi sulla via di Damasco —
né mai lo sguardo aver levato a un cielo
altro dal suo, da tanta gioia in croce.

Quero agora outra vez brancas as minhas letras,
inaudito o meu nome, minha graça cerrada;
que eu me estenda sobre o quadrante dos dias,
a vida reconduza à meia-noite.

E o meu vale cor de rosa dos olivais
e a cidade embaraçada dos meus amores
cerrados estão como breves palmas,
a minha em que se marcam todas as minhas mortes.

Ó Médio Oriente por sua voz estendido,
despertar eu quero a caminho de Damasco —
não ter o olhar jamais erguido a céu
que não o seu, de tanta alegria em cruz.

Ora che capovolta è la clessidra,
che l’avvenire, questo caldo sole,
già mi sorge alle spalle, con gli uccelli
ritornerò senza dolore
a Bellosguardo: là posai la gola
su verdi ghigliottine di cancelli
e di un eterno rosa
vibravano le mani, denudate di fiori.

Oscillante tra il fuoco degli uliveti,
brillava Ottobre antico, nuovo amore.
Muta, affilavo il cuore
al taglio di impensabili aquiloni
(già prossimi, già nostri, già lontani):
aeree bare, tumuli nevosi
del mio domani giovane, del sole.

Agora que se inverteu a clepsidra,
que aquilo que há de vir, este sol quente,
às costas já me surge, com os pássaros
voltarei isenta de dor
a Bellosguardo; lá pus o pescoço
em guilhotinas verdes de portões
e de um eterno rosa
vibravam as mãos, despidas de flores.

Oscilando entre o fogo das olivas,
brilhava o outubro antigo, amor novo.
Muda, afiava o coração
sob o corte de pipas impensáveis
(já próximas, já nossas, já distantes):
féretros aéreos, nevados túmulos
do meu amanhã juvenil, do sol.

Ilustração: Eduardo Mussi

Ora non resta che vegliare sola
col salmista, coi vecchi di Colono;
il mento in mano alla tavola nuda
vegliare sola: come da bambina
col califfo e il visir per le vie di Bassora.

Non resta che protendere la mano
tutta quanta la notte; e divezzare
l’attesa dalla sua consolazione,
seno antico che non há più latte.

Vivere finalmente quelle vie
– dedalo di falò, spezie, sospiri
da manti di smeraldo ventilato –
col mendicante livido, acquattato

tra gli orli di una ferita.

Nada ora resta, só velar sozinha
com o salmista e os velhos de Colono;
o queixo numa mão à mesa nua
velar sozinha: qual a então menina
com o califa e o vizir por Baçorá.

Nada resta, senão estender a mão
tanto quanto a noite; e desmamar
a expectativa do consolo seu,
seio vetusto que não tem mais leite.

Poder enfim viver aquelas vias
— dédalo de fogo e espécies, suspiros
de mantos de esmeralda arejada —
com o mendigo lívido, albergado

entre as orlas duma ferida.

La neve era sospesa tra la notte e le strade
come il destino tra la mano e il fiore.

In un suono soave
di campane diletto sei venuto…
Come una verga è fiorita la vecchiezza di queste scale.
O tenera tempesta
notturna, volto umano!

(Ora tutta la vita à nel mio sguardo,
stella su te, sul mondo che il tuo passo richiude).

Suspensa era a neve entre a noite e as vias
como o destino entre a mão e a flor.

Em som suave
de campanas dileto vieste…
Qual uma vara floresceu a velhice destas escadas.
Ó tenra tempestade
noturna, rosto humano!

(Toda a vida agora em meu olhar se encontra,
estrela sobre ti, sobre o mundo que teu passo encerra).

Cristina Campo
É o pseudônimo de Vittoria Guerrini. Nasceu em Bolonha, Itália, em 1923. Contemporânea e interlocutora das pensadoras María Zambrano e Simone Weil, era poeta, ensaísta e tradutora. Escreveu poucos poemas, de fina lavra e alto esplendor. Faleceu em Roma em 1977.
Hugo Langone

Nasceu no Rio de Janeiro (RJ), em 1987. Poeta, ensaísta e editor, já verteu ao português autores como Marshall McLuhan, Bertrand Russell, Flannery O’Connor, entre outros. Autor dos livros de poesia Do nascer ao pôr do sol, um sacrifício perfeito (2015) e A descida do Monte Tabor (2021).

Rascunho