Poemas de C. D. Wright

Leia os poemas traduzidos: "Retábulo do beija-flor nº 1", "Relojoeiro de vista ruim", "O andarilho em seu trigésimo ano", "Retábulo da Mulher Flutuante nº 1", "Umidade" e "O que conserva"
C. D. Wright, poeta norte-americana
01/05/2023

Tradução e seleção: André Caramuru Aubert

Rosesucker Retablo #1

Though it be the season of falling men
Presaged by crop circles
And compact moving masses
Long dresses made all the more dolorous by dark umbrellas
From these very fingers emerge pistols of love
Lilies of forgiveness
And as you enter the eye un this palm
Chuparosa bind me to your secrecy
Open your munificent purse hoard me

Retábulo do beija-flor nº 1

Ainda que seja a estação dos homens caídos
Pressagiada por marcas de círculos nas plantações
E massas compactas em movimento
Vestidos longos tornados ainda mais dolorosos por guarda-chuvas escuros
Destes mesmos dedos emergem pistolas de amor
Lírios de perdão
E conforme você deita o olho nesta palma
Beija-flor amarre-me aos teus segredos
Abra sua magnânima carteira aferrolhe-me

Clockmaker with bad eyes

I close the shop at six. Welcome wind,
weekend with two suns, night with a travel book,
the dog-eared sheets of a bed
I will not see again.

I not of time, lost in time
learned from watches—
a second is a killing thing.

Live your life. Your eyes go. Take your body
out for walks along the waters
of a cold and loco planet.

Love whatever flows. Cooking smoke, woman’s blood,
tears. Do you hear what I’m telling you?

Relojoeiro de vista ruim

Fecho a loja às seis. Celebro o vento,
fim de semana com dois sóis, noite com livro de viagem,
os lençóis com dobras de uma cama
que não voltarei a ver.

Não tenho tempo, me perco no tempo
aprendido com os relógios —
um segundo é coisa que mata.

Viva sua vida. Seus olhos vão. Leve seu corpo
a caminhadas junto às águas
de um louco e frio planeta.

Ame o que quer que flua. Fumaça da cozinha, sangue de mulher, lágrimas. Você ouve o que estou dizendo?

Wanderer in his thirtieth year

Clearly, the stores were closed.
The road open.
Snow blowing up the steps
like dust. I let him in,
took his things.
He just wanted to sit
in the dark, watch the fire.
He did not drink
so much as he slept.
Not sleep
so much as he dreamed.
He left before I got up.
The longhair bore her litter
on the fleece of his coat.
One bus groaned
over the mountain.
Carrying one rider.
Snow whirling over the floor.

O andarilho em seu trigésimo ano

Claramente, o comércio estava fechado.
A estrada, aberta.
A neve soprava os degraus
parecia poeira. Eu deixei que ele entrasse,
peguei suas coisas.
ele só queria se sentar
no escuro, olhando o fogo.
Ele não bebeu
tanto quanto dormiu.
Não dormiu
tanto quanto sonhou.
Saiu antes que eu acordasse.
A gata aconchegou seus filhotes
na lã de seu casaco.
Um ônibus roncou
subindo a montanha.
Levava um passageiro
Neve a rodopiar sobre o chão.

Floating Lady Retablo #1

Remember I remember I lay my young bullocks
On thine altar bald and cold as the truth I was your
Personal all purpose all weather fuck machine before the finger
Of suspicion could fire one bad shot the door
Closed on us I am the emancipated white man in the paddock
Common as dirt I scare the horses I can lie
At any good speed Recuérdame as I dig you from the short stob
Of memory in my path Love Letter #3 recuérdame
Siempre go try your luck on the mountain if it pleases ye

Retábulo da Mulher Flutuante nº 1

Lembre me lembro depositei meus novilhos
Em teu altar desnudo e frio como a verdade eu era tua
Máquina de foder sempre a postos sempre pronta antes que o dedo
Da suspeita pudesse errar um tiro a porta
Fechou-se para nós sou o homem branco emancipado no pasto
Ordinário como a sujeira afugento os cavalos posso mentir
Na velocidade que for Recuérdame enquanto te desenterro do toco
Da memória em minha trilha Carta de Amor nº3 recuérdame
Siempre vá tentar a sorte na montanha se for o que desejes

Humidity

There are no houses no trees there is no body
of water. Things are as they seem.
They are driving around another beltway of light.
A hand glows under the radio’s green dial.
Both are taken up with their own itinerant thoughts
about a borrowed binoculars or mineral rights
to an unknown relative’s land. They are at a point in space
where animate dark meets inanimate darkness.
Flares from refineries ignite their faces.
There are no houses no trees…
Pods of satellite dishes focus on an unstable sky.
Soon they will exit and look for a cafe
where there are people. We’ll hear them order
charcoal and beer, watching the fan work the smoke.
They could even take a room, and submit
unto the soaked bedding with one hundred strokes of night.
Here where the imperfection gives way to perfection.
Things are as they seem. There are no houses
no trees and no body of water.

Umidade

Não há casas não há árvores não há uma
lagoa. As coisas são o que parecem.
Eles estão dirigindo ao redor de mais um anel viário iluminado.
Uma mão brilha sob a luz verde do dial do rádio.
Ambos imersos em seus próprios pensamentos itinerantes
sobre um binóculo emprestado ou direitos de mineração
de terras de um parente desconhecido. Eles estão naquele ponto no espaço
onde o escuro animado encontra a escuridão inanimada.
Chamas das refinarias incendeiam seus rostos.
Não há casas não há árvores…
Antenas parabólicas miram um céu instável.
Logo mais procurarão uma saída em busca de um café
onde houver mais gente. Poderemos ouvi-los pedindo
carvão e cerveja, observando o ventilador dissipar a fumaça.
Eles talvez até peçam um quarto, rendendo-se
aos lençóis umedecidos de centenas de noites.
Aqui onde o imperfeito dá lugar à perfeição.
As coisas são o que parecem. Não há casas
não há árvores não há uma lagoa.

What keeps

We live on a hillside
close to water
We eat in darkness
We sleep in the coldest
part of the house
We love in silence
We keep our poetry
locked in a glass cabinet
Some nights We stay up
passing it back and
forth
between us
drinking deep

O que conserva

Vivemos na encosta de um morro
perto da água
Comemos no escuro
Dormimos na parte
mais gelada da casa
Fazemos amor em silêncio
Conservamos nossa poesia
fechada num armário de vidro
Há noites em que ficamos acordados
trocando entre nós
poemas
enchendo a cara

C. D. (Carolyn) Wright
Nasceu em Mountain Home, Arkansas (EUA), em 1949. Foi uma poeta prolífica e premiada. Morou em muitos lugares, incluindo o México, e foi também editora e professora. Morreu prematuramente, em 2016, no auge da produtividade, por conta de uma trombose após uma longa viagem de avião do Chile para os Estados Unidos.
André Caramuru Aubert

Nasceu em 1961, São Paulo (SP). É historiador formado pela USP, editor, tradutor e escritor. Autor de Outubro/DezembroA vida nas montanhas e Cemitérios, entre outros.

Rascunho