Poema de Leonardo Gandolfi

Leia o poema "Desvão"
Leonardo Gandolfi, autor de “Robinson Crusoé e seus amigos”
01/11/2004

Desvão

O vir pela calha
derrama por sobre
ti teu próprio encontro
No entanto que é da
cor destas paredes
fechando o caminho
das linhas da mão
Dói em ti e em mim
desaguar-se no
desvão desta casa

*

Dentro de tal nome
porque não sei como
a casa é mais que isso
Vermelho e sem cor
o abraço bem-vindo
na espera do atraso
desses passos dados
calçados em vão
Alguém te convida
— entrar é preciso

*

E assim se apresentam
no chão disso tudo
tuas unhas roídas
por quantas palavras
por quantos desvãos
Assim esse nome
dito por quem chega
Quanto desengano
o no entanto de água
que há diante de ti

*

Conhece-te então
o céu e o desvão
de toda alegria
Isto que estaria
numa mesa posta
em ti aos domingos
Conhece pois tua
submersa estória —
sorriso espremendo
os dentes e o rosto

*

Do invisível no
papel é possível
notar um espelho
d’água aparecer
Que tal essa imagem
abrindo e fechando
as mesmas palavras
Que tal isso assim —
enfim refletida
boquiaberta a flor

*

No corpo fechado
da felicidade
enquanto e por isso
a casa é aberta
Deixadas aqui
como quem espera
devagar as sílabas
tocam toda a flor —
mediatriz da mesa
em franco dispor

*

Ainda que fique
um quê de saudade
no que não existe
há sempre uma voz
que leva o que pode
das coisas que ficam
No verso e na casa
a álgebra das pétalas
ao chão sabor da
dormência na língua

*

Instantes depois
o que for insiste
Não fosse o poema
teu nome seria
pudesse o no entanto
leonardo gandolfi
ainda porque
desfeito o desvão
o gesto é o mesmo —
a mão estendida

Leonardo Gandolfi

Desvão integra o livro No entanto de água (inédito).

Rascunho