Poema de Carlos Nejar

Leia o poema "Antielegia à justiça"
Fotocolagem de Tereza Yamashita
01/11/2005

Antielegia à justiça

Habeas-corpus de mentir
impetro, com o de chorar.
O mundo não pode ouvir
toda a verdade do mar,
dos vulcões, a brevidade
de amigos pela tarde
e inimigos, se digo:
um rio me invade
com seu riso de serpente.
E quem sobrevive: mente
para boi dormir
ou acordar de repente.
E se esqueço a metade
dos montes de feno, traio
o tão legítimo empenho
de me esconder do veneno.
Se afasto o sucedido
é o suceder que me barra.
Posso parir nos ouvidos,
mas o que sair da fala
é trovão mais que vivido,
tempestade em copo de alva.
Habeas-corpus de mentir,
um habeas para comer,
habeas para progredir
ou na facada morrer.

Carlos Nejar

É poeta, ficcionista, tradutor e crítico literário, membro da Academia Brasileira de Letras e da Academia Brasileira de Filosofia. Nascido em Porto Alegre (RS), em 1939, é considerado um dos mais importantes poetas da sua geração. Nejar, também chamado de “o poeta do pampa brasileiro”. Lançou seu primeiro livro, Sélesis, em 1960. Como tradutor, verteu para o português obras de autores como o chileno Pablo Neruda. O romance Matusalém de Flores será lançado em breve pela Boitempo.

Rascunho