Poemas de Philip Larkin

Leia os poemas traduzidos "Quereres", "Tempo triplo", "Tempos", "Quão distante", "Aurora" e "Irmã feia"
Philip Larkin, poeta lírico, melancólico e complexo
30/03/2020

Tradução e seleção: André Caramuru Aubert

Ugly sister

I will climb thirty steps to my room,
Lie on my bed;
Let the music, the violin, cornet and drum
Drowse from my head.

Since I was not bewitched in adolescence
And brought to love,
I will attend to the trees and their gracious silence,
To winds that move.

Irmã feia

Escalarei os trinta degraus até o meu quarto,
Ficar na cama;
Deixar que a música, o violino, o trompete e a bateria
Cochilem na minha cabeça.

Já que na adolescência não fui enfeitiçado
E levado ao amor,
Verei as árvores em seu gracioso silêncio,
E ventos a fazer movimento.

……………..

Dawn

To wake, and hear a cock
Out of the distance crying,
To pull the curtains back
And see the clouds flying —
How strange it is
For the heart to be loveless, and as cold as these.

Aurora

Despertar, e ouvir um galo
Longe, distante, cocoricando,
Abrir as cortinas
E olhar para as nuvens, voando —
Como é estranho, isso
De um coração não ter amor, e tão frio quanto aquilo.

……………..

How distant

How distant, the departure of young men
Down valleys, or watching
The green shore past the salt-white cordage
Rising and falling,

Cattlemen, or carpenters, or keen
Simply to get away
From married villages before morning,
Melodeons play

On tiny decks past fraying cliffs of water
On late at night
Sweet under the differently-swung stars,
When the chance sight

Of a girl doing her laundry in the steerage
Ramifies endlessly.
This is being young,
Assumption of the startled century

Like new store clothes,
The huge decisions printed out by feet
Inventing where they tread,
The random windows conjuring a street.

Quão distante

Quão distante, a partida dos rapazes,
Descendo os vales, ou observando
A costa verdejante por trás dos cordames embranquecidos de sal
Subindo e descendo,

Vaqueiros, carpinteiros, ou simplesmente
Ansiosos para se livrarem
De vilarejos casados antes da aurora
Acordeons tocam

Em pequenos terraços sobre montanhas d’água
Até tarde da noite
Doces sob as muitas estrelas que dançam,
Quando o acaso, de contemplar

Uma garota lavando roupa na terceira classe
Se ramifica infinitamente.
Ser jovem é assim,
Suposições de um século aterrorizante

Como lojas de roupas novas,
As grandes decisões que deixaram pegadas
Inventando o lugar onde pisam,
Janelas, ao acaso, a invocar uma rua.

……………..

Age

My age fallen away like white swaddling
Floats in the middle distance, becomes
An inhabited cloud. I bend closer, discern
A lighted tenement scuttling with voices.
O you tall game I tired myself with joining!
Now I wade through you like knee-level weeds,

And they attend me, dear translucent bergs:
Silence and space. By now so much has flown
From the nest here of my head that I needs must turn
To know what prints I leave, whether of feet,
Or spoor of pads, or a bird’s adept splay.

Tempos

Meus tempos, caídos como panos brancos
Flutuando a meia distância, se tornam
Uma nuvem habitada. Eu chego perto, me curvo,
Vejo um apartamento iluminado, de onde saem murmúrios.
Oh, jogo de estratégia que me cansei de jogar!
Agora eu o atravesso como um capinzal,

E elas me observam, queridas e transparentes montanhas:
Silêncio e Paz. Por ora, é muito o que já saiu voando
Do ninho da minha cabeça, que o que preciso deve mudar
Para que eu saiba que pegadas deixarei, se dos pés,
De patas de animais, ou das passadas de observadores de pássaros.

……………..

Triple time

This empty street, this sky to blankness scoured,
This air, a little indistinct with autumn
Like a reflection, constitute the present —
A time traditionally soured,
A time unrecommended by event.

But equally they make up something else:
This is the future furthest childhood saw
Between long houses, under travelling skies,
Heard in contending bells —
An air lambent with adult enterprise,

And on another day will be the past,
A valley cropped by fat neglected chances
That we insensately forbore to fleece.
On this we blame our last
Threadbare perspectives, seasonal decrease.

Tempo triplo

Esta rua vazia, este céu a lavar o vazio,
Este ar, com o outono um pouco nublado
Como uma reflexão, constituiu o presente —
Um tempo geralmente azedo,
Um tempo que os fatos não recomendam.

Por outro lado, eles criam algo diferente:
Este é o futuro mais distante que a infância enxergou
Entre as longas casas e os céus a vagar,
Ouvido nos sinos lutando entre si —
Um ar que cintila com os negócios dos adultos,

E que no dia seguinte será passado,
Um vale semeado com vastas e negligenciadas possibilidades
Jogando a culpa em nossas últimas
E puídas perspectivas, a cada estação, menores.

……………..

Wants

Beyond all this, the wish to be alone:
However the sky grows dark with invitation-cards
However we follow the printed directions of sex
However the family is photographed under the flagstaff —
Beyond all this, the wish to be alone.

Beneath it all, desire of oblivion runs:
Despite the artful tensions of the calendar,
The life insurance, the tabled fertility rites,
The costly aversion of the eyes from death —
Beneath it all, desire of oblivion runs.

Quereres

Além disso tudo, o desejo de estar só:
No entanto o céu fica escuro com cartões-convites
No entanto nós seguimos as precisas instruções para o sexo
No entanto a família é fotografada sob o mastro da bandeira —
Além disso tudo, o desejo de estar só.

Sob tudo isso, corre o desejo do olvido:
Apesar das ardilosas tensões do calendário,
Do seguro de vida, dos empacotados ritos de fertilidade,
Da custosa aversão que têm os olhos à morte —
Sob tudo isso, corre o desejo do olvido.

Philip Larkin
Bibliotecário reservado e avesso às badalações literárias, Philip Larkin (1922-1985) foi um dos principais nomes da poesia inglesa do século 20. Lírico, melancólico e complexo, Larkin foi pouco traduzido no Brasil. Nelson Ascher e Alípio Correia de França Neto são os maiores divulgadores de sua obra por aqui.
André Caramuru Aubert

Nasceu em 1961, São Paulo (SP). É historiador formado pela USP, editor, tradutor e escritor. Autor de Outubro/DezembroA vida nas montanhas e Cemitérios, entre outros.

Rascunho