O pai perguntou por que ele fez aquilo e não e não perguntou mais nada. O menino não respondeu coisa alguma, e nem tinha o que responder. Apenas ficou olhando ora para a parede, ora para o telhado, morrendo de vergonha.
O pai entrou no banheiro, sem olhar para o filho, urinou e fez a barba, depois saiu de lá novamente sem tomar conhecimento de sua existência. Sentou-se para tomar o café sem chamar o filho, como fazia todas as manhãs. O menino não agüentava mais o peso do silêncio, quando o pai resolveu abrir a boca, ainda cheia de café com leite e cuscuz, para desabafar, entre enraivecido e queixoso:
— Vou ter que trabalhar o final de semana inteiro, fazer hora extra, para poder pagar a vidraça do seu Nestor que você destruiu, moleque.
Aí o menino criou coragem e disse que o pai não precisava se preocupar:
— Quem vai pagar a vidraça sou eu.
O pai o olhou incrédulo, como se olhasse para uma parede que fala, e o menino foi incisivo:
— Deixe, pai. Vendo meu time de botão.
— E quanto você acha que vale a porcaria do seu time de botão?
— Não sei. Mas se não for suficiente, vendo laranja descascada na porta de casa. Deixe que eu pago essa merda.
O pai engoliu o bocado e arregalou os olhos. Depois desamarrou a cara, abriu um sorriso desconcertante que até hoje o menino lembra como o mais bonito que já viu.
O menino ficou feliz e orgulhoso com a reação que seu desabafo causou no pai. Só não sabe se foi porque prometeu pagar o prejuízo ou se foi mesmo por causa do “essa merda”.