Poemas de Maria Thereza Noronha

Leia os poemas "Alguns mandamentos do poeta", "Miroares" e "Seis"
Maria Thereza Noronha, autora de “O verso implume”
01/05/2009

Alguns mandamentos do poeta

Escolhe com apuro teus vocábulos,
a cabeça não ponhas no patíbulo.
Não espalhes incenso num turíbulo
nem aceites esmolas como um óbolo.
Abre os olhos, ergue os ombros. Cântico
algum de sereia — inda  que lúdico —
te  seduza. Não andes tal sonâmbulo
pelas letras e motes. Traça um ângulo
(antes que em ti se faça rasa tábula)
de cento e oitenta graus além da fábula.

Miroares
A Murilo Mendes e ao seu A idade do serrote

Miríades de miroares evocando imagens
refletem tardes provincianas.
Miradouros de si mesmos, miroares
lançam ao passado sagazes miradas
(côncavas ou convexas).
Miroares juizforanos
desfilando personas em seu duplo
desvendam tempos da rua Direita
dos apitos das fábricas
dos comícios na praça da estação.
E pianos em cada mansão.
Miroares murilianos:
o poeta reacende o cotidiano
— mirongas e insuspeitadas verdades
do verde vale mineiro entre montanhas.

Seis

Seis palavras à procura de um poema
— pirotécnicas e pirandellianas —
passeiam pela noite descuidada.
Dadas as mãos, atravessam a praça,
olham o céu, buscando comovidas
da lua cheia a face sextavada.
Contam estrelas, meio envergonhadas:
bem sabem o banal deste recurso
e vão-se afastando, cabeças baixas.
Seis palavras flutuam, indecisas,
em demanda de estrofe onde se encaixem.
Soltas, nada mais são que sopro, brisa.
Soltas, nada mais são que folhas novas
brotando da videira, pressurosas:
furam o tronco e ainda não são uvas.

Maria Thereza Noronha

É mineira de Juiz de Fora. É autora de A face na água (1990), Pedra de limiar (1993), A face dissonante (1995), O verso implume (2005), entre outros.

Rascunho