Gustaf Sobin

Leia os poemas traduzidos "Monstruosamente angelical", "Domínio", "Pastoral", "Prefácio" e "O que a música quer"
O poeta norte-americano Gustaf Sobin: preocupação rítmica e formal
01/09/2023

Tradução e seleção: André Caramuru Aubert

Monstrous angelic

dawn dissolves into rocks, veins
of wheat. while the dream
still juts,
effuses a monstrous softness that

crawls in the wind with its
white scratches.

Monstruosamente angelical

a aurora se dissolve em rochas, veias
de trigo. enquanto o sonho
ainda perdura,
esbanja uma suavidade monstruosa que

rasteja ao vento com seus
arranhões brancos.

Dominion

not light.
not even the seeds of light. but its black humus,
its dampness dreaming through the flesh,

the breath still, its shimmering globe still
wordless, imminent: an opal
of trolling falcons!

Domínio

não a luz.
nem mesmo as sementes da luz. e sim seu húmus negro,
sua umidade sonhando através da carne,

a respiração parada, seu globo cintilante ainda
mudo, iminente: uma opala
de falcões cantarolando!

Pastorale

was autumn
in its bled metals. who,
again, was with you,
was the clear wound you moved through, the

lens of the meadows the last bees seeded…

Pastoral

era outono
em seus metais sangrando. que,
de novo, estava com você,
era a clara ferida você passou pelas

lentes dos prados que as últimas abelhas semearam…

Preface

might have ended here, at the
very outset, fruit
bobbing white
be-

fore your very
eyes, the clouds, the
fat
skeins of the prophetic, yet

un-
scrolled.

Prefácio

poderia ter acabado aqui, bem
no começo, fruta
balançando branca
di-

ante de seus próprios
olhos, as nuvens, as
gordas
meadas do profético, ainda por

de-
senrolar.

What the music wants
in Memory of George Oppen

what the music
wants is
pod and tentacle (the thing
wiggling,
wild

as washed
hair, spread). is our-
selves, in-

serted. within
our
own rhythms: wrapt, voluted,
that miracle
of
measure-

ascendent. to
stand, that there’s some-
where to

stand. marble
over

moorings, the
scaffolds, now, as if
vanished, and the steps, the
floors: spoken
forth. to
stand, stand there, with-

in
sound alone,
that

miracle!

is what the
waters comb, and the
bells,
beating,
count (faint, now, over the

waves, in a
garland
of
bells). is

somewhere, and
wrapt

in the bulb
of its
voices, are buoyant, among.

O que a música quer
em Memória de George Oppen

o que a música
quer é
vagem e tentáculo (aquilo
balançando,
selvagem

como cabelo
solto, enxaguado). somos nós mes-
mos, in-

seridos. dentro
dos nossos
próprios ritmos: embrulhados, retorcidos,
aquele milagre
de
medida-

ascendente. para
ficar, de que há al-
gum lugar para

ficar. mármore
sobre

amarras, os
patíbulos, agora, como que
desaparecidos, e os degraus, e
os pisos: falados
na frente. para
ficar, ficar ali, den-

tro
do som somente,
aquele

milagre!

é o que as
águas alisam, e os
sinos,
batendo,
contam (desfalecem, agora, sobre as

ondas, numa
coroa
de
sinos). está

nalgum lugar, e
embrulhada

no bulbo
de suas
vozes, flutuam, dentre.

Gustaf Sobin
Nasceu em Boston (Estados Unidos), em 1935. Passou a maior parte da vida na França, onde faleceu em 2005. Lá, tornou-se discípulo e amigo do poeta René Char (1907-88), que exerceu grande influência em sua obra, seja numa pegada surrealista, seja na grande preocupação rítmica e formal.
André Caramuru Aubert

Nasceu em 1961, São Paulo (SP). É historiador formado pela USP, editor, tradutor e escritor. Autor de Outubro/DezembroA vida nas montanhas e Cemitérios, entre outros.

Rascunho