A correntinha brilhando entre os dois pombos.
— Ai, João, que me mata.
Abismo de prazeres. No dentinho de ouro, o fulgor de sirigaita.
— Um beijinho mais.
— Não, que eu morro.
— Malvadinha.
Um azedinho de bala têm seus beijos. Delícias do canto da corruíra.
— O avô tem sono leve, João.
— A gente fica bem quietinho.
— Me morde aqui.
A marca roxa. Beijo de vampiro enlouquecido? Uma baratinha coça as antenas, no seu canto. A leprosa.
— Ouviu barulho?
— É o vento, Maria.
— O avô acorda, João. Ai, que agonia.
— Não se acanhe. Um beijinho só.
Ingrata. Negaceando. Inventa o avô só para vê-lo sofrer.
— Pensa que não sei do padeiro? Com ele é só abismo de rosas. Comigo, raso de espinhos.
Cigarrinho nos dedos amarelos, finge ir embora. Ela agarra o seu braço.
— Se for, me mato.
— Exibida. Pra mim já morreu, e bem morrida.
— O doutor proibiu. Faz mal.
— Onde o conheceu?
— É médico da família. Pessoa de respeito.
— Ele vê os seus peitinhos?
Enrola a correntinha. Sorri, sem negar, afirmando.
— Ele te vê toda nua?
— Só uma vez. Fui com o avô.
— De consultório fechado?
— Muito respeitador. Tomou pressão.
— É velho? Baixinho? Alto, de bigodinho?
— Pediu para eu ir duas vezes por semana. Sabe como ele me chama? Santinha.
— Pegou no seu pé?
— Sou moça sofredora, João. Só quando me casar.
A diabinha.
— O avô não vê, Maria. Me contento com dois beijos.
Olhos reluzentes nos dois pombos de alvura brilhosa.
— Cabem na mão, Maria. E tão quentinhos.
Aflito, abre a blusa de seda vermelha. Ela negaceia.
Quer beijar o pezinho. Suspirando de olhos cerrados.
— Deixa, amorzinho.
Ela deixa. Gemendo.
Na porta, duas batidas.
— É o meu noivo! Ai, que morro. João, pula a janela!…
Espera que ele desapareça na esquina. Então, suspirosa, abrindo a porta. — Boa noite, doutor. Eu estava tão saudosinha.