O capacho do 414

Conto de Fausto Amadigi
Ilustração: Theo Szczepanski
01/02/2012

No capacho em frente à porta está escrito: “Seja bem-vindo à república independente da minha casa”. Apesar da amabilidade da mensagem, bem sei que o vizinho não me convidaria para entrar. São seis da tarde, horário de depositar o lixo no contêiner próximo à escada, no outro extremo do corredor. O corredor estreito e comprido tem exatamente dez portas numeradas de quatrocentos e onze a quatrocentos e vinte, cinco à direita e outras cinco à esquerda. Naturalmente, cada número corresponde a um morador. De ponta a ponta estende-se um tapete verde desbotado e sujo que percorro com vinte e seis passos. Com as sacolas de lixo na mão, detenho-me no passo de número dezessete, em frente ao apartamento quatrocentos e quatorze, o único da fileira de portas com capacho e mensagem de boas-vindas. Foi apenas este detalhe que me levou a cogitar a possibilidade de fazer uma visita ao vizinho. Reflito um instante e considero minha impulsiva intenção completamente fora de propósito: oras! bem sei que o vizinho não me convidaria para entrar. De qualquer modo, antes de seguir os nove passos restantes até o contêiner de lixo, limpo o calçado no capacho de boas vindas do 414.

Fausto Amadigi

Nasceu em Querência do Norte (PR), em 1978. É autor de Cento e tantos poemas.

Rascunho