Poemas de Adri Aleixo

Leia os poemas "Estas árvores não foram pensadas para o Sertão", "Ladainha para um dia qualquer", "As latas na cozinha" e "Mulher na roca"
Lori Figueiró, Rio Jequitinhonha, Coronel Murta, maio de 2017
28/01/2019

Estas árvores não foram pensadas para o Sertão

Vieram do bico d’algum pássaro

nasceram perto do rio
e têm memória de mar

A menina passa pra buscar a tabatinga
as raízes do pequizeiro rompendo esperas não lhe ensinam nenhuma paciência

…..

Ladainha para um dia qualquer

Com alguma sorte
ela pode dividir o dia em dois
manhã e noite
como quem divide o chuchu
e reparte entre os filhos
suas bocas rotas
famintas
o dia
a casa
essa membrana invisível
medrando afora vontades
o dia
que ainda sendo noite é dia
e não termina até que se faça sopa
até que se tenha água
esquente o fogão
a serpentina
os muitos banhos
os quartos
cobertas
velas
rezas
dorme com Deus, mãe!

Lori Figueiró, São Gonçalo do Rio das Pedras, Serro, março de 2016

As latas na cozinha

Agora que virou o ano
a cozinha tem alguma ou outra novidade
a folhinha do Cristo na parede
o anuário do papa
e as latas de pêssego e goiabada
que embora tenham ganhado alças
pousam na janela como pássaros

…..

Mulher na roca

Se o sol batesse nela
a essa hora do dia
teríamos a imagem de um jarro
as mãos em cálice amparando
o som os fios
olhando mais de perto, sentiríamos vivos
a casa, os móveis
as folhas de carvalho
onde vivem a neta, os filhos
falaríamos de coisas complicadas e outras elementares
de certo, eu acharia tudo doído
mas ela diria: é o ciclo

Adri Aleixo

Mineira, publicou dois livros de poesia: Des.caminhos (2014) e Pés (2016), e a plaquete Impublicáveis em 2017. Possui textos em sites e revistas de todo país como Suplemento Literário de Minas GeraisGermina e Mallarmargens. Os inéditos da presente edição fazem parte de seu próximo livro: Das muitas formas de dizer o tempo, com imagens de Lori Figueiró.

Rascunho