Quando tenho problemas, vou andar no parque. Meu pai acha que falta poder de persuasão e convencimento: Você não consegue convencer uma criança; como pensa comandar nossos negócios? — Respondo que tenho me dedicado, que estou estudando. — É preciso lábia, não teoria, convencer, filho, convencer.
Recordar essas palavras sempre me decepciona, meu próprio pai não crê em mim. Às vezes, pela manhã, ao me barbear, olho-me por longo tempo no espelho, e me pergunto o que será de minha vida. Nunca sei responder. Nessas horas até mesmo eu duvido de mim.
A manhã está cheia de sol. No parque não há mais ninguém, exceto eu e o menino, que brinca ao lado do passeio: dá saltos espetaculares; no ar, abre os braços e fecha-os depressa; ao cair, os tem unidos ao peito. Olha-os logo, querendo ver o que há neles, permanece assim por algum tempo, depois, num gesto desamparado, deixa-os pender ao longo do corpo; e volta a repetir o malabarismo. Detenho-me a observá-lo, geralmente crianças fazem brincadeiras esquisitas, mas esta, em particular, chamou minha atenção. Curioso com sua insistência em repetir os saltos, pergunto-lhe qual era a brincadeira. Responde com seriedade:
— Não. Não é brincadeira. Eu quero pegar a luz do sol, mas não consigo.
Esperava qualquer coisa, menos uma resposta assim. Então explico que a luz do sol não se pode pegar, apenas sentir.
— Só queria um pouquinho, guardar comigo para as noites escuras, para os dias de chuva.
Na sua voz e gestos um desespero. Observara que, ao saltar, ele sempre caía com as costas voltadas para o sol, seu corpo, então, fazia sombras aos braços, daí imaginava que a luz escorregava de suas mãos. Pedi que repetisse o malabarismo, mas que, desta vez, o fizesse voltado para o outro lado. Indeciso, ele salta um salto maior que todos os outros, cai com os braços presos ao peito.
— Veja, eu disse, olhe quanta luz. Segure-a firme e corra guardá-la, antes que ela fuja.
Olha os braços inundados de sol e, numa alegria de menino, corre para casa, os braços esticados e firmes, sustentando a luz. Confesso: sinto um prazer covarde, pois sei que, na primeira sombra de árvore, a luz que ele carrega irá desaparecer.
Pela lógica, o cargo de diretor da nova filial, inaugurada no mês passado, seria meu. Não foi. Não encarei a decisão de meu pai como traição, no fundo eu já sabia que na hora de decidir ele não me escolheria. A desculpa de que sou mais útil ao seu lado, que a minha presença de filho o deixa fortalecido, não foi convincente, pois são raras as vezes que estamos juntos; quase nem sabemos nada um do outro. Na verdade, essa decisão me aliviou, preocupava-me o fato de assumir um cargo na empresa, tomar decisões, negociar, convencer. Mas por outro lado perturba-me o fracasso de não ter a confiança dele. Os filhos estão sempre querendo provar aos pais que são capazes de alguma coisa; eu não sei ao certo o quê, mas também estou tentando provar algo, talvez não a papai, mas a mim mesmo. Enquanto busco respostas para minhas dúvidas, decido caminhar. Já no parque, percebo que o tempo mudou, talvez chova; ainda assim prossigo. E o menino está lá.
Corre ao meu encontro e, antes que eu fale qualquer coisa, diz:
— Olhe, vai chover. Se não fosse você eu não teria conseguido guardar a luz do sol. Quando chove e nas noites escuras, ela invade meu quarto.
Perplexo, nada posso dizer, vejo-o correr, fugindo da chuva. De longe acena e agradece. Ergo a mão retribuindo, e uma angústia fere meu coração. Começa a chover forte e, ali, no meio da chuva, imagino o abismo que o sugará quando ele crescer.
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Durante muito tempo não voltei ao parque, mas hoje o dia está com brilho especial; sinto vontade de ir lá. Estou a horas pensando: recordo o menino querendo pegar a luz do sol, a alegria de seu sorriso ao imaginar que podia guardar tal luz. Acho que ela sempre esteve lá: dentro dele. Penso também na minha indecisão e na lição que aprendi com o menino, ele me fez entender como as coisas são simples, basta acreditar. Um movimento brusco me desperta das lembranças. É papai que empurra minha cadeira de rodas de volta para casa.