Tiros de espoleta

Resenha do livro "Arcabuzes", de Noel Nascimento
Noel Nascimento, autor de “Arcabuzes”
01/05/2008

A história do Paraná foi pouco contada ao longo destes anos. E acontecimentos interessantes a serem divulgados não faltam. Levando-se em consideração este fato, deveríamos louvar os esforços de Noel Nascimento com seu Arcabuzes. Nele, o autor percorre os três estados do Sul do Brasil no período que antecede a libertação dos escravos até os primeiros anos da República. No cenário paranaense, o romance alcança o Cerco da Lapa, episódio histórico da Revolução Federalista em que tropas fiéis ao presidente da época, Marechal Floriano, resistiram em menor número contra o ataque dos maragatos que vinham do Sul e queriam depô-lo.

É uma pena, porém, que tantas histórias boas tenham sido reunidas de uma maneira estranha, que não condiz com a sua grandeza. Ao longo da leitura de Arcabuzes, vemos que Nascimento fez um grande trabalho de pesquisa e dá-nos a impressão de que ele não quis deixar de lado nenhuma das muitas histórias coletadas. Ao mesmo tempo, ao tentar incluir alguns personagens fictícios que conduziriam a narrativa, o autor hesita em dar-lhes mais importância que a história ocorrida. Assim, os personagens criados, que deveriam fazer a ligação entre os diversos acontecimentos, não conseguem executar a sua tarefa. Ficamos, então, com um apanhado de histórias que têm uma seqüência cronológica, que dão o cenário da época, mas que parecem deslocadas da trama.

Outro ponto que prejudica a leitura é o estilo do autor. Em muitas passagens, não há ação, há apenas a descrição de como era a vida àquela época. O pretérito imperfeito é o tempo verbal dominante de grande parte da narrativa. As coisas aconteciam, as pessoas andavam, Xandô (personagem principal de Arcabuzes) viajava, enfim, tudo ou “ia” ou “ava”, poucas coisas aconteceram ou foram feitas. Reconhece-se, porém, um estilo no autor, que esteve em voga na literatura nacional em tempos passados, mas que agora já não são mais empregados. Talvez por isso tenha causado a estranheza.

Por fim, lamenta-se a diagramação do livro. Mais uma vez uma editora consegue tornar a leitura muito difícil. Pergunto: em tempos de tanta tecnologia gráfica, é difícil fazer um trabalho minimamente decente, levando em consideração que por trás do livro existe um leitor? O mercado editorial brasileiro está repleto de exemplos eficientes na confecção de livros. Basta segui-los. Muitas editoras perdem leitores (e compradores) devido ao amadorismo com que tratam o seu trabalho.

Apesar do desleixo editorial, a história e as histórias contadas são tão empolgantes que insistimos na leitura, que vai aos trancos e barrancos. E com ela acompanhamos Xandô, nascido em Ponta Grossa, menino diferente dos demais, iluminado, com algo de Xangô, como disseram os negros que o conheceram logo após seu nascimento. Xandô, quando chega à adolescência, parte para estudar em Curitiba e depois vai fazer o curso universitário no Rio de Janeiro. É ao longo de sua história que Noel Nascimento conta as demais histórias daquele período tão rico de nosso País. Infelizmente, a falta de concatenação entre elas deixa-as meio que perdidas, sem ligação entre si. Uma pena. O livro poderia render muito mais, pois o material é riquíssimo. Será necessário esperar que outro autor retome o período para, quem sabe, produzir algo mais agradável à leitura.

Arcabuzes
Noel Nascimento
Juruá
280 págs.
Adriano Koehler

É jornalista. Vive em Curitiba (PR).

Rascunho