Os lugares distantes às vezes ficam perto. Bem perto. Logo ali, dobrando a esquina, depois do terreno baldio “guardado” por um grande búfalo que nos aponta uma direção. Ora, não há distância grande o bastante para quem tem imaginação fértil. E isso o australiano Shaun Tan tem. Afinal, não é qualquer um que cria um personagem como esse búfalo gigante que mora num terreno baldio e sempre aponta a direção correta — para o que quer que seja. O búfalo do rio é a história que abre Contos de lugares distantes. E, a partir dela, sabe-se que há muita coisa fantástica por vir.
É um encantamento após o outro. Uma viagem atrás da outra. São 15 histórias/contos/textos que costuram belíssimas ilustrações. Quinze passeios por temas que variam do lúdico à guerra, do estranhamento ao reconhecimento, do casamento à poesia. O clima é fantástico, como nos sonhos. E é por isso que as histórias não precisam ter, necessariamente, um final bem marcado, com moral e tudo o mais. Não, não. As histórias acontecem e vão até o ponto em que acordamos. E isso basta.
Tan é um escritor interessante e competente. Mas, acima de tudo, é um grande ilustrador. Um belo artista plástico, muito criativo. O que casa perfeitamente bem numa empreitada que precisa aliar o visual e o textual, como no caso da produção para o público infanto-juvenil. É interessante perceber, por exemplo, que as ilustrações de Contos de lugares distantes vieram antes dos textos. A escrita, aqui, é complemento para as imagens — e não o contrário. No conto Velório, a imagem é a de vários cães sentados sobre objetos (cama, tevê, mesa, maquina de lavar) olhando para o nada — mas todos na mesma direção. Com o texto, sabemos que a cachorrada estava olhando para uma casa em chamas. A casa de um homem que havia matado, alguns dias antes, seu cão a pauladas.
O visual — de forma um pouco diferente — é um atrativo também em Chuva ao longe. Aqui, o texto aparece todo picadinho, em pedaços de papel nos quais se veem desenhos, partituras musicais, bilhetes ou palavras soltas. Todos esses retalhos dão conta, ou melhor, nos instigam a imaginar: onde, afinal, vão parar os poemas não lidos? Uma viagem lúdica e muito poética. Leve, alegre, romântica (por que não?).
O livro é muito envolvente. Divertido, poético, saboroso. E não é porque está repleto de ilustrações que somente as crianças (maiorzinhas, é verdade) e adolescentes vão gostar. Os adultos vão, também, viajar nas histórias fantásticas e delicadas deste livro. E no final, com certeza, vão se divertir tentando encontrar, nas ilustrações dos versos da capa e contracapa, algumas referências dos textos que acabaram de ler. O búfalo está lá.