Quando prometem logo na capa que o livro vai ser policial, a gente quer que o livro seja policial, ora. Não precisa ter tiros, nem sangue, nem romance do detetive com a moça bonita — que pode ser a vilã ou a mocinha. Nada disso é necessário. Mas ter uma boa história, ah… isso, sim, é preciso. E se a história não for tão boa assim, o livro precisa ser muito bem escrito para, pelo menos, valer as horas gastas pela leitura. O crime mais cruel, de Miriam Mambrini, não se encaixa em nenhuma dessas alternativas. Nem tem uma história muito interessante, nem é tão bem escrito. Não é diferente de nada que já tenhamos lido nos jornais ou em qualquer outro lugar por aí. Está bem no meio, sabe como é?
Veja se isso não lhe traz várias lembranças à cabeça, imediatamente: o seqüestro do filho mais novo de um empresário cheio da grana, no Rio de Janeiro. Já ouviu, não é? O que poderia vir depois? Que tal uma série de suspeitos? O seqüestrador pode ser um comparsa da babá, afinal ela foi a última a ver o piá antes de ele ser levado. Ou então pode ter sido um dos vários ex-empregados insatisfeitos com as demissões feitas pelo empresário. Ou quem sabe um jardineiro que está de férias providenciais e que precisava da grana, que estava fácil, fácil ali na casa do patrão. Quem sabe, para ficar mais interessante, poderia ser a ex-mulher interesseira. Ou todos eles juntos? Ou nenhum… Poderia ser uma gangue dessas aí que anda aterrorizando o nosso país, por que não? Vários suspeitos! Até aí, viu alguma coisa de diferente? Nem eu.
Certo, então o que resta é procurar pelo diferencial que a editora prometeu no release de divulgação do livro: a idéia é agregar “a trama psicológica ao gênero policial, envolvendo o leitor não somente na movimentação dos personagens em torno da solução do problema, mas também na gama de conflitos ocultos que permeia a relação entre os personagens”. Aí dá menos gosto ainda. Comecemos pelo empresário rico. Acham que ele nasceu rico? Surpresa! Não. Era pobre. Batalhou e ficou rico e tal. Casou com socialite, cansou da moça, teve um caso com a secretária — também outra pobretona —, que engravidou, e separou da outra para ficar com a ex-amante (que era, obviamente, mais nova). O filho mais novo era o xodó — e esse, é claro, é que foi seqüestrado. Ok? Ah… Ele, o empresário, tem um irmão mais velho, que por ironia, chama-se Próspero. E, obviedade, nasceu, cresceu e vai morrer pobre. É, ou melhor, quer ser escritor. Passemos ao próximo: a babá. Moça humilde que foi abusada pelo padrasto e teve que se virar no morro, onde morava com o namorado, ex-poderoso do tráfico pela redondeza. O cara foi morto num confronto com a polícia. O irmão dela mora lá também e também é envolvido com o tráfico. Ela, aparentemente, é “limpa”. Ufa! A socialite é socialite. Tem dois filhos e está preocupada se o valor do resgate vai entrar, depois no valor descontado na partilha dos bens… A nova mulher do empresário é boazinha, mas não vê mais no marido o homem com quem se casou — oh, meu Deus! Eis que aparece um novo homem em sua vida — um cara especialista em resolver seqüestros — e faíscas são vistas a quilômetros de distância. Precisam de mais? Nem eu!
As histórias policiais há muito deixaram de ser — se é que alguma vez o foram — um gênero menor, de menos cuidado. Nada contra histórias leves e cotidianas. Mas os leitores merecem um pouco mais de carinho na escolha das palavras, das tramas e das personagens.