Romantismo subversivo

Resenha do livro "Castro Alves, um poeta sempre jovem", de Alberto da Costa e Silva
01/06/2006

O poeta Castro Alves é, para todos os efeitos das aulas de literatura no colégio, o poeta da abolição. Mais do que autor do romantismo, pertencente a uma geração que morreu jovem, Antonio Frederico de Castro Alves ajudou a forjar a imagem que se tem até hoje acerca dos poetas: passionais, coléricos, sem nenhum interesse  que não seja a poesia. A propósito, pelo que se lê no brilhante perfil assinado por Alberto da Costa e Silva — Castro Alves, um poeta sempre jovem —, o rapaz de Curralinho era ao mesmo tempo a imagem e o construtor de cenas capazes de externar um sentimento de revolta no tocante a uma página infeliz da história do Brasil: a escravidão.

De volta ao início do parágrafo anterior, não há aluno do ensino médio que não tenha essa certeza: “Castro Alves foi o poeta dos escravos”. Segundo a análise de Alberto da Costa e Silva, essa impressão era um dos objetivos do próprio Castro Alves, originando-se daí a natureza pública (e política) dos seus versos. Nas palavras do biógrafo: “O rapaz sabia o que fazia: não escrevera aqueles versos para serem lidos em silêncio, mas para serem recitados para a multidão. O seu era um poema que se queria subversivo. Revolucionário”. E assim o foi.

Como se nota no trecho acima, este perfil de Castro Alves não se limita a trazer uma perspectiva tão-somente pessoal do poeta, mas concilia, como poucos textos do gênero, o autor e sua obra numa relação quase inseparável, ainda que, para tanto, apresente as contradições entre o discurso do poeta e sua prática. Isso porque é bem possível que Castro Alves tenha aceitado o trabalho escravo em sua residência. Costa e Silva sobre isso escreve: “Os abolicionistas deviam enfrentar diariamente problemas de consciência. Eram contrários a uma instituição que os forçava a depender dela”. Notam-se, aqui, os méritos do autor deste perfil que não produz uma peça de apologia ao poeta. O perfil mostra Castro Alves por inteiro.

Além dessa, outras virtudes chamam a atenção nesta “minibiografia”. De um lado, tem-se a leitura crítica da obra do poeta, demarcando não só o estilo como também a evolução no que se refere à proposta temática. Por outro lado, há que se fazer menção à análise do contexto histórico em que o país do poeta Castro Alves existia. Nesse quesito em particular, Costa e Silva soube indicar ao leitor as principais características da sociedade escravocrata e a influência disso na formação cultural do Brasil.

Em pouco mais de 180 páginas, acrescidas de bibliografia e índice onomástico, Castro Alves, um poeta sempre jovem não é apenas mais uma biografia de um artista nacional. Se fosse apenas isso, aliás, já seria grande coisa, num país pouco acostumado a esse tipo de reflexão. O que se lê, no entanto, supera as expectativas iniciais até mesmo dos amantes da vida dos grandes artistas do passado. Com argúcia de historiador e as palavras de um poeta, Costa e Silva disseca com lucidez a breve, porém intensa, lírica e criativa vida de Castro Alves.

Castro Alves, um poeta sempre jovem
Alberto da Costa e Silva
Coleção Perfis Brasileiros
Companhia das Letras
200 págs.
Fabio Silvestre Cardoso

É jornalista e doutor em América Latina pela Universidade de S.Paulo. Autor de Capanema (Record, 2019)

Rascunho