Greta Benitez com seu Café expresso blackbird é uma surpresa muito positiva: sabe para que veio e entende do riscado. No título deste seu livro de estréia, já se percebem as intenções da autora: seus versos se apropriam de termos em línguas estrangeiras (principalmente a inglesa), presentes com muita freqüência em todo o livro, transitando na contramão das tendências dos puristas brasucas. Depois a ambientação: suas tragédias, seus desencontros, sua ironia, seu cinismo, seu orgulho, se desceram em bares e cafés — perfeitamente representados pela dissimulação do néon —, em meio à fumaça e ao vinho.
Num universo internetizado, até o amor se globaliza, idealizado na tatuagem de um marujo, como pode ser lido nos surpreendentes versos de Italiano: “A luz verde dos meus olhos, lanterna/ inusitada/ se arrasta, agitada, pelo chão molhado./ O que estou procurando?/ Um italiano tatuado/ estaria ele caído no chão, fulminado/ pelas balas disparadas/ de festim/ quando eu disse sim?”
Talvez a ditadura no Brasil, o sonho do socialismo lá fora, talvez a censura tenham castrado um pouco o egocentrismo: a transubstanciação só era possível por meio da anulação do indivíduo em prol da coletividade. Isso se refletiu de forma nociva na literatura e mais especificamente na poesia: o “eu” se achou desterrado por uns tempos. Greta não tem receio de trazê-lo de volta, dar-lhe abrigo: se não fala em primeira pessoa, descreve impressões bastante particulares.
Quando opta pela rima, o faz com segurança e precisão: “Esta noite o meu hino/ é um tango argentino/ e a cor do meu céu/ é um blues de motel”; “Hoje me sinto assim/ Tão estranha, sozinha e feliz/ como um anão de jardim”. Claro que às vezes exagera: “Mas tudo que tenho/ É uma tarde distante/ Uma manhã diamante”. Neste sentido, o livro poderia até ser um pouco mais fino, se algumas (poucas) poesias de qualidade incerta fossem suprimidas.
Café expresso blackbird é dividido em três partes: poesias com título, poesias sem título e a interessante poesias em barra. Esta última, com sete textos, que poderiam ser considerados minicontos, embora sigam a mesma poética do restante do livro.
Há nos versos de greta outros exageros que poderiam ser evitados: são as pseudo-aliterações: “Brinque com um drinque/ Faça uma farsa/ Siga a seta”. Há outros exemplos em toda a obra, basta o leitor procurar. Aparecem, entretanto, algumas transgressões, cujos efeitos caem muito bem em meio aos versos, quebrando um pouco o ritmo e causando um estranhamento benéfico. Trata-se das incursões de palavras estrangeiras ao longo dos versos: “Beautiful canela”, “cat depravado” e assim por diante.
Greta Benitez é, sem dúvida, outro belo achado da Landy e Café expresso blackbird é uma antologia madura, de uma poetisa consciente da qualidade de sua literatura, erguida com flashes cotidianos, na qual por vezes tudo é tão vazio que nem a solidão tem vez: “Num domingo com sol demais/ Um jornal voa ao vento/ E não se sabe bem de onde/ Um radinho de pilha narra um jogo/ Onde parece,/ Nenhum gol acontece”.