Nada mais estimulante do que começar a leitura de um livro sabendo que terá começo, meio e fim, nesta época de invencionices sacadas sempre como geniais, que se espraiam em nome de todo tipo de senhor. Mais estimulante ainda quando este livro faz os olhos brilharem com achados preciosos do tempo e do espírito. E, além disso, quando este livro mostra que a criatividade, na reconstrução de fatos históricos da vida cotidiana, pode ser bastante esclarecedora, mesmo quando sutil.
Assim vejo o livro Imagens da evolução de Curitiba, de Otávio Duarte e Guinski. Dá para se observar que este trabalho de proposta aparentemente simples, como diz o próprio título, é um dos mais completos da atualidade sobre a história a capital paranaense, pós máquina fotográfica. É belo e útil.
Percebe-se que o livro é resultado de garimpagem, pesquisa dedicada e do trabalho de quem está acostumado a varar madrugadas na busca de fazer o melhor. É possível ver e sentir este esforço. A tarefa de construir um livro como este, onde existe um notado equilíbrio entre o texto e a imagem, no cenário da história verdadeira possível, recontada a partir elementos pontuais e de maneira atraente, dentro do melhor estilo jornalístico de concisão, não é para marinheiro de primeira viagem.
Para quem se situa no futuro, a evolução das sociedades — do Brasil, do Paraná ou de Curitiba — proporciona visões singulares em épocas distintas, com muitos matizes. Podemos ter um ou outro ponto de vista sobre nossa evolução, dependendo do legado que nos deixaram. Nesse sentido, Curitiba teve sorte, pelo menos na parte mais importante de sua história. O livro de Duarte e Guinski mostra de maneira abrangente esta riqueza.
Imagens da evolução de Curitiba respeita o compasso da história, a visão clássica e, assim, como a própria cidade, foi aflorando com o barro e a madeira, depois com a pedra, o cimento e a cal. É quase impossível destacar a importância de uma foto sobre a outra porque o momento histórico é único. Mas são imagens que traçaram nosso destino, que emocionam; por isso, citar algumas delas, mesmo sob risco de menosprezar outras, dá o clima do livro.
A foto panorâmica do Alto do São Francisco, de 1870, que mostra a velha igreja do Rosário dos Pretos de São Benedito, que não existe mais. Os rostos felizes das crianças polonesas, de eterna beleza, na chegada a Curitiba com seus pais imigrantes, em busca da esperança. O ordeiro comício da praça Santos Andrade, onde os curitibanos foram comemorar a invasão da Normandia pelos Aliados. O futuro doutor Zequinha, enfrentando a cavalaria da PM com um bodoque, no célebre 1968 — um dos registros fotográficos mais marcantes sobre a revolta estudantil. Os jardins da praça Santos Andrade cobertos pela última neve. A Boca Maldita plena de gente no comício da arrancada das Diretas. O olho imponente do Museu Oscar Niemayer, com suas passarelas curvilíneas, ao cair da tarde.
Além das fotos e de outros elementos iconográficos, dão um toque de especial beleza ao livro os registros históricos das aquarelas e telas de John Henry Helliot, Theodoro de Bona, Alfredo Andersen, Arthur Nísio e Guido Viaro. E as esculturas e painéis de João Turin e Poty Lazarotto.
Otávio Duarte e Guinski, que têm formações clássicas, ousaram buscar, neste livro, arrisco a dizer, o novo no velho. E mais: conseguiram romper, na forma que o construíram, aquela tradição saudosista que sempre procurou separar a “velha” Curitiba da “nova” Curitiba. Os que aqui nasceram ficavam de um lado. E os que escolheram Curitiba para morar ficavam de outro.
Imagens… deixa Curitiba muito mais próxima do que é.