15 anos de literatura ou O dinossauro que sobreviveu à hecatombe

Este editorial meio torto, meio desconexo, só pode acabar com algo extremamente necessário: muitíssimo obrigado a todos que (de alguma maneira) contribuíram para que o Rascunho chegasse até aqui.
Arte da capa: Ramon Muniz
17/04/2015

O Rascunho chega aos 15 anos com esta edição 180. É algo a ser comemorado? Tenho dúvidas de que seja. Meu arrogante pessimismo não me deixa entrever grandes comemorações quando se trata de literatura. Mas, digamos, é um fato relevante, levando em consideração o ambiente inóspito no qual o Rascunho sobrevive. É uma história de sobrevivência — o que não é grande novidade. Periódicos literários (com raríssimas exceções) têm uma característica rastejante quase insuperável. Aos solavancos, aparecem e desaparecem. Muitos deles sem qualquer protagonismo. Sobreviver parece ser a sina a que fomos condenados. Neste caso, o Rascunho talvez seja um animal raro, um dinossauro que sobreviveu à hecatombe. E, agora, que chega à adolescência tenta com todas as forças alcançar a idade adulta. Talvez seja possível.

É claro que ninguém (muito menos eu) imaginaria que aquela reunião num boteco apertado e cheirando a bolinho de carne, em Curitiba, resultaria, segundo alguns, em um dos principais veículos culturais do Brasil. Tudo isso graças ao empenho de dezenas de pessoas todos os meses. Então, este é, sem dúvida, um momento de agradecimento. Seria impossível chegar até aqui sem o empenho de todos os colaboradores (jornalistas, escritores, ilustradores, críticos, professores, etc.), que a cada mês emprestam um pouco do seu tempo e talento ao Rascunho. Desde aquele 8 de abril de 2000 muita coisa mudou — o que é bastante previsível. O jornal cresceu, passando de 8 páginas para as atuais 48. No início, éramos cerca de 10 pessoas. Hoje, praticamente um exército de 60 pessoas a cada edição. O Rascunho espalhou-se pelo Brasil afora. E é lido por quase 50 mil pessoas (nas versões impressa e on-line).

Mas um aspecto continua intacto, inabalável: acreditamos muito na importância da literatura na vida das pessoas, na vida de um país como o Brasil. Muitos de nós perdemos a vitalidade do corpo, o tempo faz o seu laborioso trabalho, com métrica e engenharia, mas seguimos firmes no propósito que nos levou a criar o Rascunho e a mantê-lo vivo, mesmo nos momentos de grande tormenta. O que nos move é um ímpeto quase juvenil de manutenção de um projeto necessário para nós e para milhares de outras pessoas. O amor (sim, talvez soe um pouco piegas) pelos livros é o que mantém o Rascunho vivo aos 15 anos. Não fosse isso, obviamente, estaríamos carpindo outro matagal, desbravando outras selvas, matando outros animais.

E, juntamente, com todos os colaboradores vêm os nossos assinantes. Distante do mercado publicitário, o Rascunho mantém-se hoje graças aos seus entusiasmados assinantes. Nosso objetivo para 2015 é chegar à marca de 4 mil assinaturas. Para o mercado editorial esta marca é risível. Mas para o Rascunho é a certeza de que mais 15 anos são possíveis.

Este editorial meio torto, meio desconexo, só pode acabar com algo extremamente necessário: muitíssimo obrigado a todos que (de alguma maneira) contribuíram para que o Rascunho chegasse até aqui.

Um abraço e até o editorial de 30 anos.

Rogério Pereira

Nasceu em Galvão (SC), em 1973. Em 2000, fundou o jornal de literatura Rascunho. É criador e coordenador do projeto Paiol Literário. De janeiro de 2011 a abril de 2019, foi diretor da Biblioteca Pública do Paraná. Tem contos publicados no Brasil, na Alemanha, na França e na Finlândia. É autor dos romances Antes do silêncio (2023) e Na escuridão, amanhã (2013, 2ª edição em 2023) — finalista do Prêmio São Paulo de Literatura, menção honrosa no prêmio Casa de las Américas (Cuba) e traduzido na Colômbia (Babel Libros) — e da coletânea de narrativas breves Toda cicatriz desaparece (2022), organizada por Luiz Ruffato.

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