Da areia branca e fina há versos sem fim. (…)
Instantes da realidade recortados dos vários espaços que transitam à nossa volta, quer através da visão; quer através de todos os outros sentidos que, como ímanes, agarram-se à pele. Pequenos mundos celulares, peças na engrenagem, que dão vida ao corpo inteiro. No olhar individual de um filho que espreita a pedra no caminho, podemos encontrar a curiosidade da criança, que descobre a textura, a dureza, o peso, o contorno, e a integração desta, na paisagem. À sua volta, no parque infantil, pássaros povoam as árvores, um carro apita do outro lado da rua, e as vozes contagiam ouvidos e se espelham nos vários corpos. O filho é este indivíduo no seu oásis, um recorte da realidade que, muitas das vezes, diz sobre o resto que falta, ou complementa, ao quadro.
“Eu quero falar das coisas pequenas, das minúcias, do invisível, quando estou no mundo da literatura”, diz Andréa Pelagagi. Para ela, este mundo, o da folha em branco, é aquele onde cada detalhe é, em si, uma história completa; muitas vezes imperceptíveis quando vemos, por exemplo, a floresta que tudo engole no seu imenso manto verde. Interessa a esta escritora, o filho e as suas descobertas aos três anos de idade, a pedra à sua frente no caminho, a folha que acabou de cair de uma árvore, os sons que chegam vindos de várias latitudes, o cheiro da chuva que é libertado em cada canto do parque, após a sua passagem, ou o barulho nostálgico de um mar, ao longe, que hipnotiza.
A escritora valoriza o ponto de vista do individual, para talvez abarcar o coletivo. Diz não procurar o genérico dos vários cenários, mas sim o átomo, a unidade básica de construção de toda a matéria, e que encerra também um mundo no seu interior; e isso vale também para os rótulos criados no universo do literário: literatura de mulheres, literatura de imigrantes, ou de outros clãs particulares. “Eu quero a literatura de uma mulher; de uma pessoa (…) dizer que aquilo que escrevo é sobre mulheres, é muita coisa, são muitas mulheres juntas; ou são muitos imigrantes, enfim (…) eu gosto do livro sobre a Ana, ou sobre a história do fulano (…) quero construir um mundo através das várias coleções de indivíduos”, explica.
A escritora vai no contraciclo de uma sociedade voraz, que nos cobra por não opinarmos logo no calor dos acontecimentos. O todo é fascinante, o genérico salta à vista, mas também atormenta, já que não absorvemos tudo com a mesma rapidez. “Eu preciso assimilar; preciso pensar; eu não sei tudo sobre todas as coisas.” E daí o micro, a célula, o indivíduo, o tempo do relógio parado. O tempo suficiente para construir pontes entre ela, a escritora (entre ela, a pessoa única), e o outro.
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