A pergunta me foi feita pelo grande escritor Ronaldo Correia de Brito para um vídeo que compartilha no seu site [ronaldocorreiadebrito.com.br]. Fiquei inquieto e dei a resposta que mais me pareceu apropriada, não só para aquele momento mas para sempre. Repensei a pergunta diversas vezes até que respondi: “Para tornar a vida suportável”. Reparem que não disse para tornar a vida mais suportável. Apenas e diretamente, incisivo, suportável. A esta mesma pergunta, que substitui a literatura pela arte (“Para que serve a arte?”), Ferreira Gullar respondeu: “Porque a vida não basta”.
Muita gente assegura que o escritor brasileiro não tem muitos leitores, mas é ingenuidade. Ninguém escreve para milhares de leitores, escreve para o leitor — isso mesmo, um só. Se existir apenas um só, ainda que seja um parente, o texto estará cumprindo sua tarefa de acalmar a dor de existir. Os estudiosos antigos chamavam de “o peso da existência”. E Clarice Lispector chegou a fazer a personagem Macabéa, de A hora da estrela, tomar um analgésico uma vez por dia sem sofrer nenhuma dor física. A uma pergunta de outra personagem — “Por que você toma este comprimido todo dia?” —, ela respondeu: “Porque a vida dói”. Não podemos reduzir a literatura a um analgésico, é claro. Mas a literatura faz a vida ficar mais saudável, mais leve, mais bela.
Mesmo assim, a pergunta é bem mais ampla e mais abrangente, se nem mesmo a literatura tem uma definição precisa? Isso mesmo? O que é literatura? Em tese, bastaria dizer que literatura é a obra bem escrita. Que atinge um alto grau de beleza? Quer dizer então que cartas, relatórios, e-mails, cartazes, não são literatura? Daí a questão que provoca os estudiosos. Alguns deles ressaltam que todo escrito é literatura. As cartas dos descobridores, por exemplo. Ou os diários de comerciantes e empresários. Diários de adolescente não são literatura? Precisamos pensar em tudo isso porque corremos o risco de cair numa armadilha elitista. Só é literatura aquilo que é bem escrito, segundo as leis da Estética tradicional ou clássica.