Começo a escrever este artigo — cujo assunto é o palavrão na literatura — e me dou conta de que algumas palavras nem precisam ser escritas para provocar os olhos do leitor. Acompanhe por favor: “vá tomar no” esta palavrinha — ou palavrão? — precisa mesmo ser escrita ou basta cortá-la? Pronto. O problema está criado. Esta palavrinha – será palavrão? — palavrinha ou palavrão, mesmo dita por um personagem, precisa ser escrita ou em silêncio continua devastadora.
Sim, poderia ser evitada, mudar de frase, aí atua o censor que resolve radicalmente cortar a frase inteira. A minha inquietação é saber quais os olhos que vão enfrentá-la. Temendo o censor, que de repente habita o escritor, não seria aconselhável mudar de assunto? Ainda mais radical.
Daí porque os censores — armados de tesoura ou caneta nos tempos da ditadura — temem as palavras escritas ou ditas — quem sabe, representadas num simples movimento de mão com o indicador e o polegar numa luta que não tem fim, ainda hoje inescrupulosos e vingativos. Agora ainda estou preocupado, muito preocupado. Queima-me a ideia de que devo mudar de assunto, ou simplesmente esquecer a frase.
Bem, quero tratar aqui, enfim, deste assunto tão necessário: o palavrão na literatura. Pode ser assunto velho demais, no mínimo fora de hora. Convenço-me, no entanto, de que os conservadores circulam muito por aí num desafio permanente. O palavrão que eu nem chamo de palavrão nem de palavrinha, basta palavra — é fundamental porque é o mote justo, de que falavam os franceses, a palavra exata, a palavra insubstituível.
Não é assunto fora de moda porque se trata da palavra e a palavra é eterna.
Sem esquecer que um dos melhores livros de Lobo Antunes se chama Os cus de Judas.
Se o personagem não a pronuncia está na hora de levá-lo ao psiquiatra.