As duas editoras destacadas nesta edição representam experiências bastante divergentes de tentativa de sobreviver longe do eixo Rio de Janeiro-São Paulo, que concentra a maioria absoluta das empresas dedicadas à publicação e distribuição de livros: a microeditora Cânone Editorial, sediada em Goiânia (GO), e a Editora Valer, de Manaus (AM), que já é uma potência regional.
Cânone Editorial
Em 1998, após aposentar-se como professora da Universidade Federal de Goiás, Ione Valadares resolveu aproveitar sua experiência na direção da editora da UFG, durante dois reitorados, e fundou a Cânone Editorial (Goiânia – GO • www.canoneeditorial.com.br). “O interesse foi dar continuidade a uma atividade que vínhamos desenvolvendo e também viabilizar a existência de uma editora em Goiânia que aliasse a busca de um padrão editorial de alta qualidade (rigor com a questão textual) a um trabalho de padrão gráfico igualmente cuidadoso e caprichado”, explica ela. De lá para cá foram 85 títulos lançados, cerca de oito novos livros todo ano, com tiragens médias de 500 a 1.000 exemplares, entre poesia, ficção, literatura infantil, crítica literária, ciências humanas, psicanálise, didáticos, biografia e jornalismo.
Ione reclama que os títulos dedicados à literatura (ficção e poesia) são os que alcançam menores resultados de vendas, e, por isso, são os que geram menor projeção dos autores. “Em geral, as livrarias e distribuidores de livros de outros estados, que já discriminam de forma explícita as editoras de menor porte, quando aceitam trabalhar com a editora selecionam os títulos do catálogo por uma análise de potencial de vendas que nunca contempla os literários.” Ainda assim, a Cânone aceita examinar originais de autores brasileiros. “As publicações de área acadêmica geralmente vêm por propostas diretas de parceria com as universidades (Federal de Goiás, Católica de Goiás e UnB), que já conhecem a qualidade do trabalho editorial que realizamos.” A Cânone banca totalmente apenas as edições cujo potencial de vendas parece claro desde a análise dos originais. “Nos casos dos acadêmicos temos contado com recursos de CNPq, Capes, fundações de apoio à pesquisa, etc. No caso dos literários e de alguns de crítica literária temos contado com apoio de leis de incentivo à cultura ou com a parceria dos próprios autores, que compram antecipadamente exemplares dos quais podem dispor para vendas, lançamentos, etc..”
O título que deu maior projeção à Cânone, fora de Goiás, foi Literatura infantil brasileira: um guia para professores e promotores de leitura, contemplado com o terceiro lugar no Prêmio Jabuti de 2009, na categoria Paradidático. Regionalmente, dois livros têm obtido maior reconhecimento: um didático, que trata da geografia e da história de Goiânia, e um da área de ciências humanas, Poder e paixão: a saga dos Caiado (dois volumes, mais de mil páginas), que recupera a trajetória de uma das famílias mais importantes da história política do Estado.
Ione afirma que, devido às dificuldades para constituir equipes que realizem um bom trabalho editorial (especialmente no que se refere à preparação de originais, edição, revisão, etc.) sem a necessidade de supervisão direta, faz com que não pense, pelo menos por agora, em deixar a estrutura da empresa crescer. “Seria difícil manter a qualidade, que é a nossa característica. Por outro lado, a abertura de portas fora do espaço regional para vendas não dependeria de um crescimento puro e simples, mas de um lance de sorte na edição de algum título que ganhasse repercussão.”.
Os próximos lançamentos previstos pela Cânone são Tragédias, batalhas e fracassos: as derrotas brasileiras nas Copas do Mundo (1950-1982); A província de Goyaz: isolamento, fronteira e unidade nacional e Estudos gerativos de língua de sinais brasileira e aquisição do português (L2) por surdos.
Editora Valer
A Editora Valer (Manaus – AM • www.editoravaler.com.br) nasceu de uma constatação. Segundo o editor Tenório Telles, responsável pela empresa, junto com Isaac Maciel, que cuida da parte financeira, existia uma rica produção literária no Amazonas que não chegava aos leitores por falta de circulação dessas obras. “Nosso sonho era disponibilizar os livros e autores que ajudaram a alicerçar a atividade literária na nossa terra, especialmente os que estavam esgotados há séculos (é isso mesmo!), como forma de aproximar as novas gerações da realidade histórica regional, ajudando, assim, no fortalecimento de nossos vínculos identitários.” Então, em 1996, como desdobramento natural da livraria que possuíam, foi fundada a editora que, com uma média de 32 novos títulos por ano, conta hoje com aproximadamente 620 títulos em catálogo, envolvendo diversos gêneros, como história, antropologia, sociologia, geografia, educação e teatro, com destaque para a literatura, que põe ênfase em textos representativos dos poetas, contistas e romancistas do Amazonas.
Com tiragens médias de mil exemplares, os títulos que deram maior projeção à editora foram os livros de poemas Estatutos do homem, de Thiago de Mello, e Sol de feira, de Luiz Bacellar; a série As aventuras do Zezé na floresta amazônica, de Elson Farias; os ensaios História da Amazônia, de Márcio Souza; A invenção da Amazônia, de Neide Gondim; Amazônia – formação social e cultural, de Samuel Benchimol; Ilusão do fausto, de Edinea Mascarenhas Dias; Teatro Amazonas, de Mário Ypiranga Monteiro; Viagem das idéias, de Renan Freitas Pinto; e História da medicina, de João Bosco Botelho. Deve-se destacar ainda as reedições de Simá — Romance histórico do Alto Amazonas, de Lourenço Amazonas, contemporâneo de José de Alencar e sem dúvida alguma uma das primeiras obras brasileiras a representar o índio em suas páginas; o livro de contos Inferno verde, do discípulo preferido de Euclides da Cunha, Alberto Rangel, e o ensaio O rio comanda a vida, de Leandro Tocantins.
Segundo Telles, o interesse principal é a publicação de temas ligados à Amazônia, economia, história, educação, antropologia, comunicação. “Os projetos específicos da editora são bancados com recursos próprios. Uma parte dos livros é publicada com patrocínio ou em co-edição com outras editoras, instituições e empresas”. Agora, segundo Telles, há um esforço concentrado no sentido de fortalecer a empresa, melhorando a distribuição, principalmente em outras regiões, com ênfase no sul e sudeste. “Para isso, estamos estruturando uma representação em São Paulo que funcionará a partir de março do próximo ano.”
Para este ano, estão previstos novos 40 títulos, entre os quais, a obra reunida de Thiago de Mello, Aqui está a minha vida; e os ensaios De cativo a liberto, de Maria do Perpétuo Socorro Rodrigues; Diálogos com a Amazônia, de Marcílio de Freitas; Amazônia: mito e literatura, de Marcos Frederico Krüger; Igapó – estórias e lendas da Amazônia, de Anísio Mello; Amazonês, de Sérgio Freire; Cultura amazônica, de João de Jesus Paes Loureiro; Amazônia — paraíso perdido, de Euclides da Cunha; Desmatamentos, grilagens e conflitos agrários no Amazonas, de José Barbosa; e Amazônia: estado, homem e natureza, de Violeta Loureiro.