As portas do vagão se abrem, dando caminho a um homem com uma maleta de couro. Minha atenção se dispersa porque, logo atrás dele, embarcam duas moças de cabelos azuis e, ainda em seguida às moças, uma freira vestida de negro. Toca a sirene. As portas se fecham. Um rapaz oferece seu lugar à religiosa, que aceita sem sorrir, ou agradecer.
A composição avança. Só agora me dou conta de que o homem da maleta se postou bem à minha frente. Então, consigo ler, já não posso deixar de ler, as palavras escritas, em amarelo gritante, em sua camiseta. Está dito: “Não aperte minha mente”. Em um impulso, ergo os olhos até sua testa, enrugada e frouxa. Tem costeletas peludas, de malfeitor.
Desvio o olhar. Estamos frente a frente, o sujeito pode se aborrecer com minha inspeção. Disfarço e volto a observar as moças que agora veem alguma coisa no celular. A freira está de olhos fechados. Reza? Dorme? Ausenta-se do tremor do mundo?
Tento me distrair olhando o mapa das estações fixado logo acima das portas. No entanto, a frase — “Não aperte minha mente” — continua a me afligir. Talvez o homem nem se dê conta das palavras terríveis que carrega no peito. Mas elas podem ser, também, um pedido de socorro, um desabafo, um choro, uma vingança.
A julgar pela testa em fole, concluo que algo, de fato, o oprime. “Próxima estação: Catete”, o autofalante anuncia. O homem não se move. Eu não me movo. Não preciso me preocupar, ele não saltará agora. Ainda terei tempo, algum tempo, para avançar em minha investigação.
Novos passageiros embarcam. Agora estamos mais apertados, o que obriga o homem a se aproximar mais de mim. Felizmente não me olha, na verdade não me vê, o que combina com a tese de que, a partir dos 70, nos tornamos invisíveis. Melhor assim, ele me deixa mais à vontade para inspecioná-lo.
O que me interessa, destaco, não é o homem, mas a frase que ele leva no peito. O grito que é incapaz de soltar e que, em um desvio, transformou-se em letras. Devo admitir, contudo, que me interesso em saber também por que aquele homem, e não outro, carrega em seu peito aquela frase.
“Falta muito para a estação Sans Peña?” — ele me pergunta. Explico que sim, que só agora estamos deixando a zona sul e que ela fica justamente na extremidade norte. Ao me ouvir, o sujeito suspira. “Algo doloroso o espera na estação final”, concluo. E, nesse exato momento, quando já me preparo para desembarcar no Largo da Carioca, eu decido: “Não o deixarei sozinho”. E não desembarco.
É um imperativo ético: quem mais, naquele vagão, entenderá que aquele homem se encontra à beira de um grande risco? Só eu sei disso. Só eu consigo ler o grito em seu peito ou, pelo menos, levá-lo a sério. Ninguém veste uma camiseta com aquela frase por acaso. Enquanto isso, a freira ressona. As meninas de cabelos azuis desapareceram.
Chegamos os dois, solidários, à estação Sans Peña. Ele salta e eu, mantendo certa distância, o sigo. Não vai muito longe: atravessa a rua, para diante de uma padaria, coloca a maleta entre as pernas e espera. A frase continua a berrar.
De que sofre aquele homem? O que, ou quem aperta sua mente, a ponto de levá-lo, através da camiseta, a esgoelar-se em plena rua? Também eu sofro. A mal do cronista é este: ele quer sempre saber. Não descansa enquanto não estabelece laços entre coisas desamarradas. O cronista é um clínico do real. Sua obsessão é o diagnóstico.
Tento imaginar uma maneira de abordar o sujeito. Avanço. Já na porta da padaria, diante dele, como se nunca o tivesse visto, eu pergunto: “O senhor sabe onde fica a estação do metrô?”. É o que me sai. Que fracasso. Talvez não funcione. “Não era o senhor que estava à minha frente no vagão que veio da zona sul?” — ele me desmascara. Então, também ele tinha me visto. Tinha me vigiado? Estava preocupado comigo?
Não posso negar: “Ah, então era o senhor que me perguntou pela estação Sans Peña?”. Sim, era ele, é claro. “O senhor está bem?” — ele me pergunta, franzindo ainda mais a testa. A frase — “Não aperte minha mente” — se incorpora em sua face. Olho para a camiseta: as letras parecem maiores ainda. O grito mais intenso.
“Sim, é claro que estou bem. Por que não estaria?” Aponta as escadas da estação bem do outro lado da rua. “Acabamos, os dois, de sair dela. Esqueceu?” Só me resta dizer: “Mas é claro. Sim, sim, é claro”. Esboça um sorriso, que desmente a frase, e continua: “Na sua idade, esses lapsos de memória são muito comuns”.
“Acontece que sou cronista”, digo, sem planejar dizer. Ele fecha a cara: “E eu com isso?”. Logo tento me corrigir: “Cronista esportivo. Escrevo sobre cavalos”. Digo isso e o sujeito se transforma. Larga a maleta no chão, aperta as mãos e diz: “Todos os meus problemas começaram com os cavalos”. Sem querer, em puro improviso, cheguei ao ponto.
Um suor gelado escorre pela face do homem. Recrimino-me. Cronistas são sujeitos irresponsáveis. Metem-se onde não deviam. Avançam sobre o real, são cães esfomeados. Ferem. As lágrimas do homem estão ali como prova. Agora aqui estou, em plena cena do crime. Terá vindo para se vingar?
“Bom, eu vou indo”, tento escapar. “Preciso pegar o metrô de volta.” O sujeito se espanta: “Quer dizer que o senhor veio à Tijuca só para voltar?”. Começa a apertar a camiseta na altura do peito, como se formigas tivessem invadido sua roupa e o picassem. “É um velho hábito”, justifico. E como ele espera uma explicação melhor, prossigo: “É só para matar o tempo”.
“Fique mais um pouco. Eu lhe pago um café no balcão.” Pode ser perigoso contrariar um louco. Mas quem não me garante que o louco sou eu? Por precaução, aceito o convite. A garçonete nos serve. Sem ter o que dizer, comento: “Interessante sua camiseta”.
Ele se surpreende: “O que o senhor acha interessante?” — me pergunta. “A frase”, admito. “É assustadora.” O homem da maleta apalpa a camiseta. “Ora, eu nem tinha notado.” E conclui: “A camiseta é do meu filho. A minha estava suja, ele me emprestou essa”.
Fala por falar, em tom displicente, desinteressado. Não se trata do homem: é a mente do cronista que, sempre em busca do inexistente, vive sob pressão. Minha cabeça começa a doer.