Quem não sabe o que é um blogue, um blog ou um weblog? Todo mundo, até mesmo minha vizinha de duzentos anos, que ainda hoje se recusa a ingressar no mundo digital, sabe que se trata de “uma página da web, cuja estrutura permite a atualização rápida a partir de acréscimos de tamanho variável, chamados artigos ou posts, estes em geral organizados de forma cronologicamente inversa na página” (Wikipédia).
Meu alter ego, Nelson de Oliveira, neste momento está organizando, para a editora Terracota, uma coletânea do que ele chama de crônicas e confissões de blogue. O título do livro? Blablablogue, é claro (www.terracotaeditora.com.br). Assim que eu soube do projeto, a grande pergunta que fiz ao organizador foi: “A quem se destinará esse livro?” E logo emendei: “Por que alguém pagará pra ler as crônicas e as confissões selecionadas, impressas e encadernadas, se elas podem ser lidas gratuitamente no blogue dos blogueiros participantes?” A resposta não podia ser outra: “Esse livro se destinará principalmente a todos os milhões de leitores que não têm e nunca tiveram acesso à internet. Eles não precisarão pagar pra ler, porque certamente o livro estará disponível nas bibliotecas municipais e escolares. Ele também se destina a todos os milhões de leitores que têm acesso à internet mas nunca se interessaram pela blogosfera”.
Para quem tem um blogue ou pelo menos é leitor de blogues, a simples idéia de que possa existir alguém completamente desinteressado dessa contemporânea forma de comunicação soa como se a pessoa dissesse que não tem fogão em casa nem é adepta da comida cozida, assada ou frita. Para quem tem um blogue ou pelo menos é leitor de blogues, o mundo e a própria blogosfera muitas vezes se confundem. Afinal os blogues estão aí, ditando o comportamento, informando, entretendo, irritando. No marketing. Na imprensa. Na literatura. Até no cinema.
Em 2008 foi lançado Nome próprio, o primeiro longa-metragem brasileiro, talvez o primeiro do planeta, a ter um blogueiro como protagonista. No caso, uma blogueira: a fictícia Camila Jam. O filme nasceu a partir do livro Vida de gato, da escritora e blogueira Clarah Averbuck, e tem como atriz principal a também blogueira Leandra Leal. Os livros de Clarah por sua vez nasceram de vários textos publicados em seus blogues.
Velocidade e interação
O número de blogues no ciberespaço tem crescido de forma exponencial. A maioria das pessoas utiliza os blogues como um diário pessoal, porém eles podem veicular qualquer tipo de conteúdo e ser usados para os mais diversos fins. Uma das vantagens das ferramentas de um blogue é permitir que os usuários publiquem o que quiserem sem a necessidade de saber como são construídas as páginas na internet, ou seja, sem o conhecimento técnico especializado de um programador.
A primeira grande diferença entre os blogues e a mídia tradicional, impressa, é a velocidade. Um artigo que levaria horas, dias ou semanas para ser publicado numa revista de papel pode estar disponível em poucos segundos para a leitura num blogue. Outra grande diferença entre os blogues e a mídia tradicional é que aqueles compõem uma rede baseada em ligações: os famosos links. Todo blogue faz ligação com outras fontes de informação disponíveis na rede, e mais intensamente com outros blogues. Por isso muitos blogueiros mantêm um blogue roll, uma lista de blogues que freqüentemente lêem e admiram, com um link direto para o endereço desses blogues. Os blogue rolls representam um excelente meio para avaliarmos os interesses e as preferências dentro da blogosfera, pois ao reunirem numa pequena comunidade, os blogues com os quais o blogueiro compartilha os mesmos interesses revelam sua personalidade e sua ideologia.
A possibilidade de interação com o visitante, que no final do post pode deixar seu comentário, opinando sobre o artigo postado ou xingando a mãe do blogueiro, também é um recurso característico dos blogues impossível na mídia impressa. Mas não vá você pensando que a blogosfera é a casa da mãe Joana. Embora um blogue permita uma enorme liberdade opinativa, seu conteúdo está sujeito às mesmas regras legais de outras fontes e seu autor sempre pode ser responsabilizado juridicamente pelo que escreve.
Igualdade de palavra
André Lemos escreveu no prefácio do livro Blogs.com: estudos sobre blogs e comunicação (Momento Editorial), organizado por Adriana Amaral, Raquel Recuero e Sandra Montardo:
Os blogs são, junto com os games, os chats e os softwares sociais, um dos fenômenos mais populares da cibercultura. Eles constituem hoje uma realidade em muitas áreas, criando sinergias e reconfigurações na indústria cultural, na política, no entretenimento, nas redes de sociabilidade e nas artes. Os blogs são criados para os mais diversos fins, refletindo um desejo reprimido pela cultura de massa: o de ser ator na emissão, na produção de conteúdo e na partilha de experiências. A cultura de massa criou o consumo para todos. A nova cultura pós-massiva cria, para o desespero dos intermediários, dos que detêm o poder de controle e de todos os que usam o corporativismo para barrar a criatividade que vem de fora, uma isegonia: igualdade de palavra para todos. Os blogs refletem a liberação do pólo da emissão característico da cibercultura. Agora todos podem (com mínimos recursos) produzir e fazer circular informação sem pedir autorização ou o aval a quem quer que seja (barões das indústrias culturais, intelligentsia, governos…). O fenômeno dos blogs ilustra bem essa cultura pós-massiva que tem na liberação do pólo da emissão, na conexão telemática e na reconfiguração da indústria cultural seus pilares fundamentais.
Caso você queira ler o livro inteiro, ele está disponível para download gratuito na íntegra em www.sobreblogs.com.br.
História e números
Jorn Barger, o primeiro blogueiro da História, foi o autor do blogue Robot Wisdom, lançado em 17 de dezembro de 1997, e o criador do termo weblog nesse mesmo ano. O blogue de Barger tinha — tem — uma aparência diferente dos atuais e ainda hoje mantém a mesma interface de quando foi criado. Pouco depois o termo weblog foi alterado por Peter Merholz, que decidiu pronunciar wee-blog, tornando inevitável o encurtamento para o termo definitivo blog, em inglês, ou blogue, em português.
Rebecca Blood, pioneira no uso de blogues, certa vez relatou suas experiências na internet, explicando que em 1999 os blogues eram distintos na forma e no conteúdo das publicações periódicas que os precederam (ezines e journals). “Eles eram rudimentares no design e no conteúdo, mas as pessoas que os produziam achavam que estavam realizando algo interessante e decidiram ir em frente”, disse ela. “Os blogueiros organizavam links interessantes de sites e de outros blogues, normalmente adicionando suas opiniões. O crédito era concedido a um blogueiro individual quando outros reproduziam os links que este havia encontrado. Devido à freqüente interligação entre os blogues existentes na época, os críticos chamaram os blogueiros de incestuosos. Os blogueiros nem se importaram. Eles sabiam que estavam amplificando a voz uns dos outros quando criavam links entre si. Foi assim que a comunidade cresceu. Os pioneiros do blogue trabalharam muito para se tornar fonte de muitos links para conteúdos de qualidade espalhados na web, esforçando-se pra escrever concisamente, utilizando os elementos que seduziam os leitores a visitar seu blogue, outros blogues e principalmente sites interessantes.”
Por tudo isso o fenômeno dos blogues está longe de ser um fenômeno de pouca amplitude, passageiro, trivial. A blogosfera não pára de crescer. Em 1999 o número de blogues era estimado em menos de trinta. No final de 2000 a estimativa era de poucos milhares. Menos de três anos depois os números saltaram para algo em torno de 2,5 milhões a 4 milhões. Atualmente existem perto de 140 milhões de blogues e cerca de 120 mil são criados diariamente (1,4 por segundo), de acordo com o estudo State of Blogosphere (verifique esses números e muitos outros em http://technorati.com/weblog/blogosphere).
O estudo revela que a blogosfera aumentou cem vezes nos últimos três anos e atualmente tende a dobrar a cada seis meses. Esse aumento significativo no número de blogues fez com que a grande mídia desse maior importância ao fenômeno: antes de 1999 apenas onze artigos jornalísticos sobre blogues foram publicados na imprensa tradicional. Já no ano de 2003 estimou-se que 647 artigos foram publicados. Em 2008 foram mais de quatro mil artigos. Os idiomas campeões no número de blogues ainda são o japonês e o mandarim, mas a participação dos outros países tem crescido consideravelmente, principalmente a fatia das nações de língua inglesa. Em relação ao Brasil, estima-se que há entre 3 milhões a 6 milhões de blogueiros e 9 milhões de leitores, o que corresponde a quase metade dos internautas ativos no país.
Uma curiosidade: no dia 31 de agosto comemora-se o Dia do Blogue, devido à semelhança da data 31.08 com a palavra blog. Nesse dia os blogueiros de vários países se reúnem numa grande celebração on-line, para promover a descoberta de novos blogues e de novos blogueiros.