Menelau
É véspera do assalto. Na assembleia,
a dissipar revoluções em curso,
o rei, com um lacônico discurso,
joeirava o ouro límpido da ideia.
Aluno de Ares, quem viera em tua ajuda?
Que novas lhe remete a alheia carta?
Ignoram as políticas de Esparta,
Cravando no seu flanco a seta aguda?
Em sonho, a gelosia se descerra.
Recebes hóspede em tua casa? É a hora
Do árduo combate! A pátria toda chora…
E hás de enfrentar ainda maior guerra…
Tua esposa está despida entre os biombos
a ser espoliada pelos pombos.
…
O rapto
Nas bandejas de prata,
a Maçã entre as Nêsperas,
uma eleita? Quem às vésperas
da agonia desata
O peplo, e rompe o ninho
dos cachos, e envenena
a água, ofertando o vinho
dos lábios? Com essa Helena,
Desaparecem tisnes
de cizânias e azares?
Nela a pluma dos cisnes
vês, pirômano Páris?
E esse rapto te agrava
sendo escravo da escrava.
…
Balada dos pactários
— Manda vir, ao compadre, outro trago:
pra ele pinga, e a mim rabo-de-galo.
— Saideira? — Não, deixa que eu pago!
E abraçando João, disse Paulo:
— Coincidências? Na idade e na vida,
ambos temos a idade de Cristo;
desde a infância parceiros de lida,
mesmo nome de esposas… Pode isto?
— Meu amigo, onde a mão do destino
conjugou-nos? Para onde nos guia?
Não nascemos sob o mesmo signo?
Se morrêssemos no mesmo dia?
— Como caros irmãos, por que nós
não fazemos um pacto ao Além?
Quando a morte buscar um de nós
que leve o outro consigo também!
Ao pactuarem, deixaram-se os broncos.
Quando a aurora nasceu, nas carroças
João e Paulo empilhavam os troncos
de araucárias pesadas e grossas.
Sexta-feira da Santa Paixão.
E cada um prosseguiu num atalho:
pela encosta galgava João
Paulo à serra iniciava o trabalho.
Com a carroça numa encruzilhada,
João estanca. — Era um vulto? Assustados,
os cavalos o lançam à estrada:
João sucumbe em sangrentos rodados.
Quando à missa a campana retruca,
da carroça de Paulo uma tora
desprendida o golpeia na nuca…
Anoitecem seus olhos nessa hora.
Do velório ao enterro, os amigos
ora podem gozar horas de ócio.
Encerrados em quartos contíguos,
repousaram por fim os dois sócios.
…
A cidade em chamas
Faz dez anos do rapto. À horrenda
pugna, um cavalo de batalha?
Os corpos, em sangrenta senda,
como os rosais que o vinho orvalha.
Nos banhos, alcovas e catres,
o quanto de lascívia aguardas?
Pra que uma imagem idolatres,
estrangulaste quantos guardas?
Quantos heróis mortos, enquanto
versos eróticos decoras
nas nádegas da loura Helena?
Mas desfeita a nuvem, o encanto
também se esvai. Morrem as horas.
É amargo o mel que te envenena.