Jairo Martins da Silva nasceu em Recife. É graduado em Engenharia Eletrônica pelo ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica), com pós-graduação em Marketing e Propaganda pela FAE/CDE e em Gestão Empresarial pela Duke University (USA). Trabalhou nas áreas de Telecomunicações e Tecnologia da Informação na Siemens, tanto no Brasil quanto na Alemanha, ocupando, na empresa, cargos de diretoria, CIO (Chief Information Officer), gerência geral e vice-presidência. Em 1995, decidiu dedicar-se ao estudo dos vinhos e de outras bebidas “espirituosas”, em especial a cachaça, sobre a qual escreve artigos, profere palestras e conferências, ministra cursos e conduz degustações, em todo o país e na Europa. Autor do livro Cachaça: o mais brasileiro dos prazeres, criou a Empresa O Cachacista para atuar nas áreas de eventos, palestras e degustações, e para prestar treinamento e consultoria em processos e em gestão de toda a cadeia de valor do negócio de cachaça no Brasil e no exterior. É professor visitante da Münchener Volkshochschule, em Munique.
• Na infância, qual foi seu primeiro contato marcante com a palavra escrita?
Estudei no Recife, no histórico Ginásio Pernambucano, onde tive bons professores de literatura e língua portuguesa. Nessa época, o contato com a obra de Machado de Assis foi muito marcante.
• De que forma a literatura surgiu na sua vida?
Mesmo quando criança, eu gostava de escrever. No primário, numa comemoração dos Dias das Mães, houve um concurso para quem escrevesse a melhor carta para a sua mãe, e a minha foi escolhida. Além disso, era muito comum na escola escrevermos biografias de autores brasileiros. Por residir no Nordeste, e observar a cada ano o flagelo da seca, eu gostava de usar o tema nas dissertações escolares.
• Que espaço a literatura ocupa no seu dia-a-dia e no seu método de trabalho?
Durante toda a minha vida profissional como engenheiro e executivo de uma multinacional, escrevi muitos artigos técnicos em revistas especializadas em telecomunicações e tecnologia da informação. Com os meus colaboradores, sempre fui exigente com o estilo e a gramática das cartas que assinava. De forma planejada, depois da publicação do meu livro Cachaça: o mais brasileiro dos prazeres, em 2006, passei a dar aulas e a escrever artigos sobre o tema. Em resumo, a literatura está presente no meu dia-a-dia e na minha filosofia de trabalho, utilizando o meu papel de educador para transmitir aos alunos a importância da palavra escrita com arte.
• Você possui uma rotina de leituras? Como escolhe os livros que lê?
Leio diariamente, numa rotina de quase três horas por dia. Devido ao meu interesse pela informação, sempre tenho na minha mesa de cabeceira, pelo menos, três livros que leio quase que simultaneamente. Os livros que leio são sempre escolhidos por mim quando vou a livrarias, o que é uma constante na minha vida. Para manter atualizadas as línguas que falo, além do português — alemão, inglês e espanhol —, estou sempre lendo livros nesses idiomas. Pela precisão da língua alemã, sempre tenho um livro nessa língua na cabeceira.
• Você percebe na literatura uma função definida ou mesmo prática?
Vejo a literatura como uma verdadeira manifestação artística, que usa a palavra escrita para transmitir informações, conceitos e experiências de forma mais elaborada e até recriada. Por outro lado, ela proporciona, a quem tem o hábito de ler, uma nova forma de raciocinar, pensar e agir, com mais lógica e estruturadamente.
• Como você reconhece a boa literatura?
O tema, a profundidade do conteúdo e a habilidade de usar a língua como uma expressão da arte são indicadores de uma boa literatura.
• Que tipo de literatura lhe parece absolutamente imprestável?
Livros de auto-ajuda, principalmente os de origem americana, com aquela superficialidade peculiar, são para mim a pior expressão da palavra, e nem devem ser classificados como literatura. Usam-se, de forma comercial, as carências das pessoas, e se escreve o que elas precisam ouvir, porém sem preocupação alguma com o sentido das coisas. O objetivo é ganhar dinheiro.
• Que grande autor você nunca leu ou mesmo se recusa a ler? Você alimenta antipatias literárias?
Nunca li Paulo Coelho e nem sinto inclinação alguma para fazê-lo. Como disse anteriormente, a minha antipatia se concentra na literatura de auto-ajuda, principalmente de origem americana, que tem o faturamento como prioridade e não a boa expressão literária.
• Que personagem mais o acompanha vida afora?
Um dos livros de que mais gostei foi O fio da navalha, de Somerset Maugham. Li este livro quando estudava engenharia eletrônica no ITA, em São José dos Campos, e me identifiquei muito com o personagem principal, Larry, que renunciou a uma vida burguesa, cada vez mais dependente do status, escolhendo viver uma vida intensa, porém simples, sem as necessidades criadas pela sociedade de consumo.
• Que livro os brasileiros deveriam ler urgentemente? E que livro os executivos brasileiros deveriam ler?
Cada brasileiro deveria ler O mundo de Sofia, de Jostein Gaarder, que, com uma linguagem simples, transmite os conceitos da filosofia, tão necessários para abrir as nossas mentes. Aos executivos, eu recomendaria o livro de Irvin Yalom Quando Nietzsche chorou, que dá lições de vida fazendo-nos refletir sobre a nossa fragilidade e as angústias escondidas em nosso íntimo.
• Como formar um leitor no Brasil?
Infelizmente, o poder da internet está prejudicando a formação do bom leitor no Brasil. Só através da conscientização do que é a boa literatura e de que o que há na internet precisa ser filtrado, simultaneamente com a redução dos preços de livros, podemos reverter este quadro a longo prazo. Às vezes, tenho até a sensação de que já perdemos o controle e, sendo assim, só outro dilúvio poderia nos dar a chance de começar tudo outra vez.