Ensinar literatura, no mais das vezes, soa como lançar enigmas aos alunos. Texto lido, parte-se para os comentários, os debates. Os alunos — e, no ensino médio, isso é corriqueiro — limitam-se ao óbvio. Para eles, qualquer trama torna-se uma aventura superficial. No ensino superior, o panorama melhora um pouco. De ambos os cenários, porém, brota a cena comum: “Não entendi assim, professor”. Ou: “Como é que o senhor chegou a essa conclusão?”. E a pior de todas: “Mas isso não está escrito”. Por que tamanho contraste na interpretação? A resposta parece óbvia: por causa da desproporção dos instrumentos de análise do professor e dos alunos.
Para ler literatura como um professor poderá servir de monitor aos professores, um guia de leitura que instrumentalizará os alunos não tão familiarizados com a literatura e suas infindáveis interpretações. Exageros à parte, a leitura das entrelinhas de um texto pode tornar uma aula de literatura interminável. E chata, não podemos esquecer esse detalhe.
O autor, Thomas C. Foster, no início de cada capítulo, nos informa que autores serão abordados nele — gente como Freud, James Joyce, Dante, Kafka, Stephen King, Lewis Carroll e Gabriel García Márquez. Pacientemente, ele comenta cada um dos pontos relevantes a uma interpretação, do cenário aos personagens, da variedade de enredos a organização dos capítulos, e, a cada detalhe, nos ensina a lançar um novo olhar. Mas não se engane: Foster não utilizará sonolentos argumentos teóricos/literários. De forma bastante descontraída, partirá das próprias obras, tornando suas “aulas” extremamente agradáveis, mesmo aos menos afeitos à prática da leitura.
As dicas do autor permitirão ao leitor — de pouca leitura — entender as idiossincrasias de cada personagem, as simbologias de determinado objeto, as justificativas para esta ou aquela atitude. Coisas que o farão descobrir o que se esconde nas entrelinhas dos livros. Cabe ressaltar que o tom de descontração é o grande charme de Foster, que não utiliza esquemas ou truques interpretativos. No entanto, é sempre bom lembrar que os caminhos apontados por ele são apenas caminhos.
Para ler literatura como um professor fará um enorme sucesso, sem dúvida, o que também nos obriga a por as barbas de molho. Primeiro, porque a necessidade de termos alguém que nos diga por onde investigar é, no mínimo, suspeita; e segundo, porque, o livro é extremamente questionável. De minha parte, jamais ambicionei ler conforme liam e lêem meus mestres. Sobretudo, os mestres acadêmicos. Assim, o trabalho de Foster deve ser lido com certo cuidado. No capítulo sobre Mitos, por exemplo, o leitor encontrará: “A união de religião e mito às vezes causa problemas nas aulas, porque alguém entende mito como ‘falsidade’ e acha difícil unificar o sentido de mito a crenças religiosas arraigadas”.
O importante é entender que não existem fórmulas para as artes. Existem categorias. Não podemos negar que o livro de Foster, a partir dos autores analisados, nos permite observar alguns aspectos da evolução da literatura. E seu autor nos apresenta um pensamento quase global acerca do assunto. Mas Para ler literatura como um professor é uma obra perigosa. Ninguém precisa ler como um professor, ninguém precisa ler conforme fulano ou sicrano recomendam. É importante ler. Tudo o mais é discutível. Não seria mais interessante ler como um aluno curioso? Um aluno capaz de pensar a literatura, de ler o maior número de livros possível, que seja capaz de tirar suas próprias conclusões, que não pense em bloco, que não tenha medo de ter opinião. Um aluno que não leia jamais como o professor, mas que leia, leia e leia.