Morar no adro
I
Os sinos guardam
e aguardam o mundo.
II
Se a vista é para o adro
a janela é oratório.
III
Na beira do sagrado
o mal não convém.
IV
Bola na janela,
menino testa a canela.
V
Se o silêncio é tema da tarde
siriemas passam sem alarde.
VI
Quando o sentir é alvo
o céu expõe as estrelas.
VII
Janela não suspende julgamento
um olho fora, outro dentro.
VIII
No escuro, bem distante do muro,
beijo apaixonado.
IX
O largo é dos cavalos
até o cão perceber.
X
O que dizer ao luar
quando não posso tuas mãos tocar?
XI
Coreto não dobra a letra
para ser correto.
XII
Passar por luz e sombras
consome uma ave-maria.
XIII
Bandeirolas anunciam o dia:
vai ter banda, cavalhada e folia.
……….
Depois de sonhar com Paul Klee
Basta
o pessegueiro de frutos brancos.
E assim que termina a fonte de pedra
um bananal com três cachos contados verdes.
Nos fundos vista para a floresta
E na frente um vale, a pequena cachoeira
na forma da água em fila.
……….
Infância
Dico Sapateiro
fez um cata-vento
e o entregou dizendo:
— corre!
……….
Viuvez
Com as pedras da antiga casa
nova casa construída
no retido do quintal
de jambeiro a limoeiro.
Nalguns dias do ano
enxerga nas jabuticabas
olhos do não mais ser.
……….
Casa da Opera
Tua coroa é lira
pelo vento tocada
E a plateia lira maior
tombada para o palco:
nau imensa.
Ouro Preto, 06/06/2020