Seios

Conto inédito de Alexandre Marques Rodrigues
01/08/2014

Jéssica tinha os seios duros, quando ela tirou a blusa eu os toquei. Eram como duas frutas verdes, firmes, talvez mangas, daquelas que a gente apalpa no mercado, não leva embora porque ainda precisam amadurar. Verdes ou não, os seios dela — eu os toquei, depois os experimentei com a boca.

Uma hora antes eu não ousaria imaginar o gosto. Nem o quarto no décimo segundo andar, todo iluminado, as janelas abertas, a cama esperando como um copo de água quando se tem sede. Uma hora antes, quando ela disse Filho da puta, mostrou o maior dedo da mão, e eu disse Não devia perder tempo com esse tipo de homem: eu não ousaria imaginar.

Não imaginei. No entanto, aconteceu. Sim: os seios dela estavam ali, tensos, tocavam os meus quando nos beijávamos. (Devagar, Jéssica tinha tirado minha camisa, aberto botão por botão, como se contasse pais-nossos em um rosário; tirou meu soutien com a destreza que nenhum homem havia tido.) Nossas bocas, juntas, uniam os seios, misturavam, e eles se beijavam também, os bicos úmidos de suor ou saliva.

Ela disse Você tem razão, e eu, embriagada pela metade, apenas repeti o que já tinha dito, achando que acrescentava algo novo, falei Não devia perder tempo com esse tipo de homem. Ela riu.

Jéssica riu, eu ri, nós duas rimos e ela pegou minha mão, me levou embora. Passamos a porta MULHERES, do lado esquerdo, no fundo do bar.

Foi no banheiro que ela me olhou estranho, que meu coração deu um pulo dentro do peito até a barriga, que ela me agarrou meio sem jeito, depois passeou a mão pela minha bunda. E foi lá ainda, no banheiro, que eu filosofei que um relacionamento heterossexual não inclui namorar no toalete; não com tanta facilidade.

Quando saímos do banheiro, Jéssica perguntou sem rodeios, propôs, Quer ir até meu apartamento, sem ponto de interrogação, simples assim: Quer ir até meu apartamento.

No elevador, que nos erguia moroso, fizemos o ritual que falhara no toalete do bar; nós duas, de frente para o espelho, ajeitávamos os cabelos, a roupa, corrigíamos a pintura dos lábios, as linhas dos olhos. O elevador parou, nós saímos.

Depois que Jéssica tirou minha camisa e meu soutien, ela tirou minha saia. A calcinha já tinha descido pelas pernas assim que aportamos na cama; apenas os sapatos vestiam meu corpo. Então eu cansei.

Na verdade, não: eu não cansei, apenas quis. O corpo dela, igual ao meu, os seios duros que eu descobria como se me olhasse no espelho, os cabelos compridos que eu segurava, puxava como tantas vezes os homens tinham puxado os meus, me domando — é claro que Jéssica não me cansava. Mas eu transbordava; e ainda precisava de mais.

Precisava e pedi. A cama foi o precário silêncio antes da tempestade, que se quebra como um vaso que cai no chão. Eu implorei. Jéssica não olhou meus olhos: ela se deitou em meus lábios, se criou em meus seios, correu por minhas coxas. Quero seu pau dentro de mim.

Eu disse Quero seu pau dentro de mim; pedi, implorei. Jéssica foi o corpo sobre meu corpo, atou meus braços pelos pulsos, com a corda dos dedos, me crucificou sobre o lençol branco. E, com suas pernas, ela afastou mais as minhas, já afastadas, e rudemente entrou em mim.

As janelas estavam abertas. As luzes berravam, todas acesas. Doze andares abaixo, a cidade era uma enorme mitocôndria, em um escambo quase mudo de glicose e energia; o mundo era uma célula que eu não entenderia: nunca teria imaginado o pau de Jéssica me preenchendo e abrindo daquele jeito.

Ela entrava e saía de dentro de mim, me provocava. Eu pedia que fosse mais fundo, mais forte, mais rápido.

O orgasmo que eu quis foi ela quem teve, cedo demais. Um rio de porra esguichou sobre mim e depois desaguou na cama, escorreu junto com seu sono. Jéssica dormiu satisfeita, o corpo abandonado na indigência típica dos mortos.

Eu vi seu peito encher e murchar, sua respiração cada vez mais pausada; apaguei as luzes, não fechei as cortinas.

Eu vi os seios, firmes, seu corpo na horizontal, não se desmancharem com a gravidade. Continuaram armados, desafiadores, prontos como dois soldados da guarda suíça, ou inglesa.

Eu vi, juntei minha roupa, espalhada pelo chão.

Quando suas pálpebras piscaram, fechadas, quando Jéssica começou a sonhar, eu fui embora. Não quis ficar. Para que eu perguntaria, na manhã seguinte, com o que ela tinha sonhado.

Alexandre Marques Rodrigues

Nasceu em 1979, em Santos (SP), onde vive. É formado em Psicologia, pela Universidade Católica de Santos. Mantém desde 2010 o blog Ler até Escrever, no qual registra impressões sobre livros (www.amarquesrodrigues.com). O conto Seios pertence à coletânea Parafilias, vencedora do Prêmio Sesc de Literatura 2014 e publicado pela editora Record.

Rascunho