Poesia pra tocar no rádio e nos olhos

A poesia portuguesa surgiu na Idade Média, quando a escrita era pouco difundida e de prática quase exclusiva dos religiosos
01/04/2000

A poesia portuguesa surgiu na Idade Média, quando a escrita era pouco difundida e de prática quase exclusiva dos religiosos.

Para facilitar a transmissão oral, único meio popular para propagação de idéias, os poetas utilizavam alguns recursos importantes, como ritmo, métrica curta e refrão, além do acompanhamento de dança, canto e instrumentos musicais. Tudo isso resultou num sólido casamento entre poesia e música.

É justamente esta relação que nos interessa, já que a partir de agora esta coluna passa a analisar os meandros dessa profícua ligação nas composições do nosso tempo.

Pra ler e ouvir – No mês passado, a poeta, haicaista, letrista, tradutora e publicitária paranaense, Alice Ruiz, lançou em Curitiba seu 14° livro: Poesia Pra Tocar no Rádio (Blocos Editora, 63 págs., R$ 10). São 53 poemas que fazem parte de seu repertório como letrista. Alice já escreveu cerca de 80 letras, das quais 70 já foram musicadas por grandes nomes da MPB.

O livro venceu no ano passado o concurso nacional de poesia, organizado pela Blocos Editora, do Rio de Janeiro. É uma edição simples, até mesmo descuidada com a apresentação gráfica e com a qualidade de impressão, mas nada que comprometa a qualidade da obra.

A começar pelo prefácio/poema escrito por um grande parceiro de Alice: Itamar Assumpção. O texto comprova a sintonia entre os dois, que, segundo a própria Alice, sempre resulta “numa explosão criativa”. Essa química já rendeu composições refinadamente ácidas e bem humoradas como “Abobrinhas, não”(pág. 60 ou no CD Pretobrás, de Itamar): Cansei de ouvir abobrinhas/vou consultar escarolas/prefiro escutar salsinhas/pedir consolo às papoulas/e às carambolas…

Já com outro parceiro Alice transformou poesia em sucesso, emplacando uma música nas rádios brasileiras e na trilha sonora de uma novela da Rede Globo.

Arnaldo Antunes musicou “Socorro” (pág. 30 ou nos CDs  “Um Som”, de Arnaldo Antunes e “Cassia Eller”, de Cassia Eller). A música trata do vazio existencial que ciclicamente assola as pessoas lúcidas e conscientes de sua condição: Socorro, alguém me dê um coração/que esse já não bate nem apanha/por favor, uma emoção pequena/qualquer coisa que se sinta/tem tanto sentimento/deve ter algum que sirva… Você que gosta de poesia e de música tem duas opções: levar o Poesias Pra Tocar no Rádio para sua estante ou ir atrás dos CDs, onde estão as versões musicadas da obra da poeta.

Na dúvida, fique com as duas. Vale a pena.

Jeferson de Souza
Rascunho