Poemas de Kay Ryan

Leia os poemas traduzidos "Névoa", "As coisas do mundo", "Orvalho", "Poesia em tradução" e "Nuvem"
Kay Ryan,poeta e educadora
01/10/2024

Tradução e seleção: André Caramuru Aubert

Virga

There are bands
in the sky where
what happens
matches prayers.
Clouds blacken
and inky rain
hatches the air
like angled writing,
the very transcription
of a pure command,
steady from a steady
hand. Drought
put to rout, visible
a mile above
for miles about.

Névoa

Existem faixas
no céu onde
o que acontece
se iguala às rezas.
Nuvens enegrecem
e a chuva escura
choca o ar
como uma escrita inclinada,
a exata transcrição
de uma ordem clara,
dura, de mão
dura. A seca
posta em retirada, visível
uma milha acima
por muitas milhas.

The things of the world

Wherever the eye lingers
it finds hunger.
The things of the world
wants us for dinner.
Inside each pebble or leaf
or puddle is a hook.
The appetites of the world
compete to catch a look.
What does this mean
and how does it work?
Why aren’t rocks complete?
Why isn’t green adequate
to green? We aren’t gods
whose gaze could save,
but that’s how the things
of the world behave.

As coisas do mundo

Para onde quer que o olhar se demore
ele vê fome.
As coisas do mundo
nos querem para o jantar.
Dentro de cada seixo ou folha
ou poça há um anzol.
Os apetites do mundo
competem por um olhar.
O que isso significa,
e como é que funciona?
Por que as pedras não se bastam?
Por que o verde não é o suficiente
para o verde? Não somos deuses
cujo olhar poderia salvar,
mas é assim que se comportam
as coisas do mundo.

Dew

As neatly as peas
in their green canoe,
as discretely as beads
strung in a row,
sit drops of dew
along a blade of grass.
But unattached and
subject to their weight,
they slip if they accumulate.
Down the green tongue
out of the morning sun
into the general damp,
they’re gone.

Orvalho

Tão em ordem quanto ervilhas
em sua canoa verde,
tão discretas quanto contas
enfiadas num barbante,
sentam-se gotas de orvalho
numa folha de relva.
Mas soltas, e
vítimas de seu peso,
elas se misturam, e deslizam.
Descendo pela língua verde
do sol da manhã,
e para a umidade geral
elas se foram.

Poetry in translation

It is
so sting—
the skin
of the living animal
stretched out
to a rug
shaped something
like the United States.
One meditates
upon a Florida-like flap—
a forward leg
which ran
the Russian steppes
perhaps?

Poesia em tradução

É tão
doído —
a pele
do animal vivo
esticada
num tapete
com formato semelhante
aos Estados Unidos.
A gente medita
sobre uma aba que parece a Flórida —
uma perna para a frente
que correu,
talvez,
pelas estepes russas?

Cloud

A blue stain
creeps across
the deep pile
of the evergreens.
From inside the
forest it seems
like an interior
matter, something
wholly to do
with trees, a color
passed from one
to another, a
requirement
to which they
submit unflinchingly
like soldiers or
brave people
getting older.
Then the sun
comes back and
it’s totally over.

Nuvem

Uma mancha azul
rasteja através
da enorme pilha
de sempre-vivas.
Vista de dentro
a mata parece assunto
interno, algo
totalmente relacionado
às árvores, uma cor que
passa de uma
à outra, uma
exigência
à qual se submetem
inabalavelmente
como soldados
ou gente corajosa
envelhecendo.
E então o sol
retorna, e
tudo está terminado.

Kay Ryan
Nasceu em San José, Califórnia (EUA), em 1945. Poeta e educadora, é uma das poetas mais respeitadas de sua geração nos Estados Unidos. Já foi Poeta Laureada do Congresso e levou o Pulitzer de 2011. No Brasil, no entanto, ela é quase completamente desconhecida.
André Caramuru Aubert

Nasceu em 1961, São Paulo (SP). É historiador formado pela USP, editor, tradutor e escritor. Autor de Outubro/DezembroA vida nas montanhas e Cemitérios, entre outros.

Rascunho