O servidor de Deus

Conto de Paulo Ribeiro
01/05/2004

No princípio era Deus e o verbo. E como nada existia, Deus fez o homem à sua imagem. Só que Deus, sujeito esquecido, coitado!, se flagrou do erro. Era um Adão decaído que se via ali. E Deus disse: é muito triste o mundo que eu fiz! E Deus então criou a senha e pariu de uma costela a tela. E para que Adão não sofresse, deu-lhe a mulher compatível. E Adão, muito ágil, tratou de logo salvá-la em arquivo Jota-pe-gê.

E Adão respondeu a Deus: Pai!, sinto-me grato com o que envias a mim! E adorou muitas, muitas vezes a mulher enviada. A Eva com seu piercing umbilical.

E Adão, desde então ficou sendo cliente, sob o domínio, preso à página de Deus. Até o final dos tempos prometeu ser-lhe fiel.

Porém, Adão era egoísta. Navegante mudo, Adão invocou novamente a Deus: Pai!, me sinto ainda triste. Deus, mesmo indignado, percebeu que as pedras de fato eram tristes em torno de Adão e Eva. E mandou-lhes então o mais lindo jardim que conseguira fazer com as próprias mãos. Era a criação das flores, plantas e frutos, e menos nesses poderiam tocar.

E era um jardim muito bonito, as águas em carambolas faziam as cachoeiras e foi nesse lugar que Deus pôs a luz no Sol. E fez o musgo beijar a musga, e fez tudo de bom.

Mas, em tão bucólica paisagem, havia um galho seco e esse era o orgulho de Deus: uma serpente vinha enroscada ali. Adão voltou a sorrir, mas vivia intrigado com aquele galho e a serpente cravejada por grãos de ouro. Cor de areia, a serpente trazia a maçã do pecado. E não passou o tempo e Adão viu a arregaçada polpa nos lábios de Eva a lhe ofertar. Era a festa, a bruxa, o veneno, tudo o que a alma simula de ruim. E Adão e Eva tiveram medo ainda mais.

Pai, o teu filho teme!, foi a mensagem de Adão.

E Deus, diante de tal prostração, sua imagem e semelhança a rastejar-se, não se apiedou deles. Em nova mensagem revelou seu rancor em espinhos e falou de pão do suor do rosto. E Deus vestiu Adão e Eva e expulsou-lhes do paraíso.

E depois mandou o pecado original pra lixeira e mudou a senha de acesso e nunca mais forneceu.

Paulo Ribeiro

É autor de Glaucha, Vitrola dos ausentes, Missa para Kardec, entre outros.

Rascunho