Poema de Gilberto Tadeu Nable

Leia o poema "Fantasmas"
Gilberto Tadeu Nable, autor de “Poemas do desalento & alguns elogios”
01/03/2006

Fantasmas

Bobagem esperar outra coisa,
pois tudo deu no que deu.
Não sobrou uma migalha na mesa
quando o último convidado sumiu.

Mas esqueceram a lâmpada acesa,
algumas portas e janelas abertas.
Desfecho apressado de festa,
em casa, agora, abandonada.

Então, os fantasmas pularam das molduras
e cada qual reassumiu seu posto.
Vovó Marieta traz o pudim de leite.
Tia Celeste se espichou no terreiro,

e jaz, transfigurada pela luz da lua.
Vovô Nagib ameaça com a bengala,
atazanado com tamanha bizarria.
Donana e o eterno bordado

cheio de flores azuis e andorinhas.
Tio Vicenzo atravessa as paredes,
e bêbado, no terno lastimável,
aponta, rindo, para minha mãe,

dançando acima dos telhados,
com uma rosa negra na boca.
E dança de pés descalços,
como se ainda fosse criança.

Os mortos são malcomportados.
Bando de funâmbulos em fúria,
refazem o que foi minha família,
fadada ao desastre e à insânia.

Porque insano sempre fui.
E por não saber mendigar,
me reduziram à indigência das palavras,
onde me recolho com meus fantasmas.

Gilberto Tadeu Nable

Nasceu em Aiuruoca, pequena cidade do Sul de Minas, em 1954. Mora em Belo Horizonte (MG). É casado com a escritora Maria Célia Ferrarez. Publicou Elegias urbanas e outros poemas (1988) e Menino abstrato (contos, 1995), ambas edições do autor, em pequenas tiragens. Em 2006, publicou Percurso da ausência (poemas) e em 2008, O mago sem pombos. Em 2019, Poemas do desalento & alguns elogios.

Rascunho