Dois poetas indianos

A poesia de Joy Goswami e Sampurna Chattarji
Ilustraçao: FP Rodrigues
31/07/2018

Tradução: Adriana Lisboa

Joy Goswami, natural de Calcutá, é um dos mais importantes e premiados poetas indianos contemporâneos. Escreve em bengali. Publicou mais de cinquenta livros, entre poesia e ensaios críticos, além de um romance em versos.

Nascida na Etiópia e criada em Darjeeling, a poeta, ficcionista e tradutora indiana Sampurna Chattarji é atualmente editora de poesia da revista The Indian Quarterly. Em oficinas de tradução, já colaborou com poetas de mais de uma dezena de países. Vive em Délhi.

Os poemas de Sampurna Chattarji traduzidos aqui foram escritos originalmente em inglês. Os poemas de Joy Goswami foram traduzidos do bengali a partir das versões em inglês de Chattarji, que trabalha com a obra de Goswami desde 2005. As traduções foram discutidas com a autora.

Joy Goswami

Amor

O trem veio passando torrencial por cima da ponte.
A luz das janelas que se moviam, a luz das portas
que se moviam se derramava na água
E subia pelas árvores ao longo do rio

Você havia chegado dessa mesma exata maneira, um dia.
Toda sua luz viajara até mim e para longe de mim.

Coloco as mãos nas árvores. Vejo que ainda estão molhadas.

Tudo estava inteiramente claro para todos. Exceto para mim.

Ilustraçao: FP Rodrigues

Em meu sono, esta chuva

O sono em que me encontro é absoluto. Em meu sono, a chuva cai. Na chuva
Alguém atravessa o campo saltando sobre cadáveres.

Alguém tenta ler as linhas do destino na testa dos mortos.

Alguém expressa simpatia pelos moradores do povoado.

O sono em que me encontro é absoluto. Em meu sono, chove forte. Na chuva
Saltando sobre cadáveres, o destino deste povoado parte em busca do próximo.

Ilustraçao: FP Rodrigues

Sampurna Chattarji

Gulliver do espaço

Pregada ao chão que é sua sombra
Por mil risadas liliputianas.

Nada pode tocá-la.

Cante uma melodia que vai desembaraçar
A nuvem negra do seu cabelo.

É nesta caixa que vão me enterrar?
Seu dia está sendo rígido e quadrado.

Nem sangue, nem osso.

O que ela deseja é
O coração de um círculo de hélio.

Vê padrões por toda parte.

Ilustraçao: FP Rodrigues

Gulliver do espaço VI

Obrigada, ela disse, pelo transe, pela elação.
Pelo clique clique clique de palavras encaixando no lugar.
Pelo claque claque claque do tear.

A respiração é uma neblina prateada. Pássaros constróem palácios.
Atravesse o lago. Junte-se à selva.

Posso ver!
Não foi o que você disse?
Deixe-me tentar outra vez. Havia uma cidade que deixei para trás.
Afogou-se na chuva.

Meninas-inseto viviam em potes, edifícios andavam com pernas de pau.
Em Bombay, uma bomba, em Mumbai, uma mãe.
E os nomes terminam em bye, em ai…

Faz algum sentido? Não?
Fragmentos de uma palavra.
Brob. Ding. Nag.
Perdão? Quantas línguas eu falo?
Duas, ela disse, apontando para os olhos
e o coração. Só duas. E você?

Adriana Lisboa

Nasceu em 1970 no Rio de Janeiro (RJ) e atualmente vive nos Estados Unidos. Entre romances, contos, livros infantis e infanto-juvenis, possui mais de dez títulos publicados. Possui três títulos em poesia: Parte da paisagem (2014), Pequena música (2018 — Menção honrosa no prêmio Casa de las Américas) e Deriva (2019).

Rascunho