O barco segue o seu rumo

Sou um pessimista otimista. Acredito com descrédito. Assim nasceu o Rascunho, em 8 de abril de 2000
01/04/2002

Sou um pessimista otimista. Acredito com descrédito. Assim nasceu o Rascunho, em 8 de abril de 2000. Um projeto de “loucos” que deu certo Na modorrenta Curitiba e sua “intelectualidade” de arames e pompa infinita. Ganhou pedaços do Brasil. Generosos pedaços. E agora nos vemos (todos nós, insanos rascunheiros — e aqui agrego todos os leitores; só em Jaboatão dos Guararapes (PE) são quatro!) no segundo aniversário. Comemoremos! Não é motivo de regozijo e de ufanismo desmedidos. Comemoremos, simplesmente. Uma conquista, com toda pieguice e bravura nela impregnada. No início, pensamos em três ou quatro edições para mostrar a todos os só pessimistas (e não pessimistas otimistas, como muitos de nós) que era possível fazer um jornal literário em Curitiba, com os olhos abertos para o mundo. É verdade que sobrevivemos. Mas sobrevivemos tão bem que nos dá um imenso prazer ser sobreviventes nesse imenso mar de sol a pino a nos destruir o corpo.

Já não estamos mais à deriva. Tomamos um rumo nesses dois anos. É certo que não sabemos em que terras aportaremos. Mas vamos navegando, com grandes doses de ironia e discussões a tentar traçar um panorama da literatura brasileira. Esse é o rumo. Não sei se chegaremos. Mas a bordo estamos e não pensamos em abandonar o barco no meio da viagem. Até o fim, nem que este fim seja melancólico. Com certeza, tentamos dar vida à literatura ao discuti-la com liberdade, contundência, profundidade, sem meias palavras, sem se esconder sobre o muro. Nunca ficamos em cima do muro. Isso nunca. Marca registrada. Para o bem e para o mal, dependendo dos olhos que nos miram. Evitamos, ao máximo, o corporativismo. O Rascunho é sempre, a cada edição, uma panela de pressão prestes a explodir. Ainda bem.

Para comemorar esses dois anos, nada melhor que uma edição especial, pelo menos na nossa opinião. Como não poderia ser diferente, temos uma boa (?) polêmica sobre Marcelo Mirisola, Domingos Pellegrini é o grande entrevistado, o teatro de Consuelo de Castro sobe ao palco, Ivo Barroso “estréia” na poesia, Miguel Sanches Neto escreve sobre crítica literária, Nelson de Oliveira, Luís Augusto Fischer e Floriano Martins mergulham fundo na literatura brasileira. Há ainda inéditos de Raimundo Carrero, Fernando Moneiro, José Castello, Altair Martins, Menalton Braff, Marcelino Freire, Lya Luft, Tércia Montenegro, entre outros. Acho que para dois anos está de bom tamanho. Como o Rascunho só publica “editoriais” de aniversário, vemo-nos em abril de 2003. Até lá. Espero.

Rogério Pereira

Nasceu em Galvão (SC), em 1973. Em 2000, fundou o jornal de literatura Rascunho. É criador e coordenador do projeto Paiol Literário. De janeiro de 2011 a abril de 2019, foi diretor da Biblioteca Pública do Paraná. Tem contos publicados no Brasil, na Alemanha, na França e na Finlândia. É autor dos romances Antes do silêncio (2023) e Na escuridão, amanhã (2013, 2ª edição em 2023) — finalista do Prêmio São Paulo de Literatura, menção honrosa no prêmio Casa de las Américas (Cuba) e traduzido na Colômbia (Babel Libros) — e da coletânea de narrativas breves Toda cicatriz desaparece (2022), organizada por Luiz Ruffato.

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