Poemas de José Lezama Lima

Leia os poemas traduzidos "sem titulo", e "A mulher e a casa"
Ilustração: Igor Oliver
30/03/2019

Tradução: Adriana Lisboa

Ah, que tú escapes en el instante
en el que ya habías alcanzado tu definición mejor.
Ah, mi amiga, que tú no quieras creer
las preguntas de esa estrella recién cortada,
que va mojando sus puntas en otra estrella enemiga.
Ah, si pudiera ser cierto que a la hora del baño,
cuando en una misma agua discursiva
se bañan el inmóvil paisaje y los animales más finos:
antílopes, serpientes de pasos breves, de pasos evaporados,
parecen entre sueños, sin ansias levantar
los más extensos cabellos y el agua más recordada.
Ah, mi amiga, si en el puro mármol de los adioses
hubieras dejado la estatua que nos podía acompañar,
pues el viento, el viento gracioso,
se extiende como un gato para dejarse definir.

Ah, que tu escapes no instante
em que já havias alcançado tua definição melhor.
Ah, minha amiga, que não queiras crer
nas perguntas desta estrela recém-cortada,
que vai molhando suas pontas em outra estrela inimiga.
Ah, se pudesse ser certo que na hora do banho,
quando numa mesma água discursiva
banham-se a imóvel paisagem e os animais mais finos:
antíloples, serpentes de passos breves, de passos evaporados,
parecem entre sonhos, sem ânsias, levantar
os mais extensos cabelos e a água mais recordada.
Ah, minha amiga, se no puro mármore dos adeuses
tivesses deixado a estátua que nos podia acompanhar,
pois o vento, o vento gracioso,
se estende como um gato para se deixar definir.

…..

La mujer y la casa

Hervías la leche
y seguías las aromosas costumbres del café.
Recorrías la casa
con una medida sin desperdicios.
Cada minucia un sacramento,
como una ofrenda al peso de la noche.
Todas tus horas están justificadas
al pasar del comedor a la sala,
donde están los retratos
que gustan de tus comentarios.
Fijas la ley de todos los días
y el ave dominical se entreabre
con los colores del fuego
y las espumas del puchero.
Cuando se rompe un vaso,
es tu risa la que tintinea.
El centro de la casa
vuela como el punto en la línea.
En tus pesadillas
llueve interminablemente
sobre la colección de matas
enanas y el flamboyán subterráneo.
Si te atolondraras,
el firmamento roto
en lanzas de mármol,
se echaría sobre nosotros.

A mulher e a casa

Fervias o leite
e seguias os aromosos costumes do café.
Atravessavas a casa
com uma medida sem desperdícios.
Cada minúcia um sacramento,
como uma oferenda ao peso da noite.
Todas as tuas horas estão justificadas
ao passar da sala de jantar à de visitas,
onde ficam os retratos
que gostam dos teus comentários.
Estabeleces a lei de todos os dias
e a ave dominical se entreabre
com as cores do fogo
e as espumas do cozido.
Quando se quebra um copo,
é o teu riso que tilinta.
O centro da casa
voa como o ponto na linha.
Em teus pesadelos
chove interminavelmente
sobre a coleção de arbustos
anões e o flamboyant subterrâneo.
Se te desorientasses,
o céu despedaçado
em lanças de mármore
despencaria sobre nós.

José Lezama Lima
(Cuba, 1910-1976), um dos mais importantes autores latino-americanos do século vinte, é autor do romance Paradiso e de vários volumes de poesia, como Muerte de narciso e Enemigo rumor, além dos ensaios La Expresión americana e La cantidad hechizada.
Adriana Lisboa

Nasceu em 1970 no Rio de Janeiro (RJ) e atualmente vive nos Estados Unidos. Entre romances, contos, livros infantis e infanto-juvenis, possui mais de dez títulos publicados. Possui três títulos em poesia: Parte da paisagem (2014), Pequena música (2018 — Menção honrosa no prêmio Casa de las Américas) e Deriva (2019).

Rascunho